Eduardo Guimarães: Eu gostaria de representar ao CNJ contra Sergio Moro. E você?
Posted by eduguim on 24/04/15 - 21:25 • Categorized as Manifesto
Ao longo da semana passada, uma cidadã brasileira passou por um constrangimento terrível, verdadeiramente impensável: essa mulher apareceu em todas as grandes redes de tevê do país – e, quiçá, do mundo – sendo acusada de operar um esquema criminoso. Sua imagem algemada, cabisbaixa, sendo conduzida pela polícia irá persegui-la para sempre.
A vida social dessa cidadã está literalmente extinta. Inclusive, muito provavelmente, essa desmoralização irá perdurar mesmo que nada fique provado contra ela – a mídia que expõe à execração pública é a mesma que não retira essa execração mesmo quando o execrado prova sua inocência.
Marice Correia de Lima, cunhada de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, teve que deixar um Congresso de que participava no exterior e voltar às pressas ao Brasil para se apresentar à polícia devido à ordem de prisão que o juiz Sergio Moro emitiu contra ela.
Essa senhora foi dada como “foragida” pela mídia só por estar fora do país, ainda que não houvesse restrição alguma a que viajasse. Passou cinco dias presa. A mídia em peso apresentou vídeo em que mulher que supostamente seria ela fazia depósito na conta de sua irmã, Giselda Rousie de Lima, esposa de Vaccari.
Nas notícias, Marice estaria depositando dinheiro sujo.
Estava provado que Marice era uma criminosa. Nas redes sociais, ela, a irmã, o cunhado, enfim, a família toda virou um bando de mafiosos. Por conta disso, o Ministério Público pediu a prorrogação da prisão de Marice por tempo indeterminado.
Felizmente, a indignação coletiva e as provas apresentadas pela defesa de Marice OBRIGARAM Moro a soltá-la, apesar da “certeza” que tinha de sua culpa.
Como se chegou a isso? Como alguém pode ser condenado dessa forma, tão rapidamente? Por que essa mulher teve que largar uma viagem de trabalho ao exterior e pouco depois aparecer como criminosa condenada em todos os grandes impérios de comunicação do país?
Foi tudo por causa de um vídeo.
A imagem captada pela câmera de um caixa-automático provocou essa sucessão de eventos dramáticos na vida de Marice. Essa foi a “prova” que o Ministério Público apresentou ao juiz Moro para que ele tomasse a decisão de mandar prender Marice. Ele, inclusive, proclamou-se convencido de que o vídeo bastaria para jogar Marice na cadeia afirmando que as imagens “não deixavam qualquer margem para dúvida”.
Em poucas horas, porém, tudo desmoronou. A “certeza” do juiz Moro, a fundamentação para a prisão de Marice (o vídeo) e, concomitantemente, o Estado Democrático de Direito.
Moro mandou soltar Marice após ficar claro que havia uma margem quilométrica para dúvidas, ainda que ele tivesse dito, um dia antes, que não havia nem um centímetro.
Moro pediu desculpas, fez alguma reparação à ofendida, soltou alguma nota que lhe permitisse gozar do princípio universal do Direito de que todos são inocentes até prova em contrário? Coisa nenhuma. O que fez foi como dar um chute no traseiro da agravada, enxotando-a de sua masmorra, sem reconhecer que se açodou na decisão de prendê-la.
Ninguém sabe se, amanhã, aparecerão provas – verdadeiras ou forjadas – que liguem Marice a algum esquema criminoso. Porém, o que havia no momento dessa prisão arbitrária e ilegal de que ela foi vítima, não era suficiente. A perdurar práticas como essa, qualquer cidadão, sob qualquer farsa que construírem, pode passar pelo mesmo.
Uma acusação falsa ou sem fundamentação adequada pode custar seu emprego, sua família, seu respeito e até a sua saúde física ou mental. A mácula temporária que estendam sobre a vida de um inocente, jamais será retirada.
E tudo isso, por que? Porque Moro teve “certeza” de que a mulher do tal vídeo era Marice. Uma certeza tão absurda, tão inexplicável, tão asquerosa que mal dá para qualificar com palavras. Simplesmente porque era visível, para qualquer um que estivesse investigando criteriosamente a vida de Vaccari, de sua esposa e de sua cunhada que a mulher do vídeo não era Marice e, sim, Giselda.
Qualquer leigo é capaz de olhar as imagens e dizer que a mulher do vídeo é a esposa de Vaccari, não a irmã. Isso desde que conhecesse as duas. Ora, como é possível que o juiz estivesse tão mal informado sobre o caso que conduz que não soubesse que as irmãs Giselda e Marice são muito parecidas?
Aliás, a facilidade para chegar a essa conclusão foi até traduzida para meios científicos por reportagem da Folha de São Paulo publicada nesta sexta-feira, 24 de abril. O jornal submeteu as fotos de Giselda e Marice e o vídeo “incriminador” a uma empresa especializada em reconhecimento facial. O laudo é extremamente “interessante”.
Confira, abaixo, a matéria da Folha. O post prossegue em seguida.
Como se vê, tecnicamente se conclui que a possibilidade de confundir Giselda com Marice é desprezível. O que, então, fez o juiz Moro dizer que não haveria “qualquer margem para dúvida” de que a mulher do vídeo era Marice?
A resposta a essa pergunta é muito simples: um possível interesse do juiz que não tenha sido compatível com a sua função jurisdicional.
A partir daqui, peço ao leitor que pare a leitura por um momento e vá se olhar no espelho, e depois volte a ler.
Voltou. Sabe o que você viu no espelho? Uma possível vítima de Sergio Moro, ou de outros magistrados como ele. Mas você viu mais alguma coisa: um cidadão brasileiro. A cidadania, meu caro leitor, lhe confere prerrogativas que muitas vezes você não conhece.
Vejo muita gente indignada com os abusos de Moro. As pessoas pedem que Dilma faça algo, que o PT faça algo, que alguém faça alguma coisa. Porém, à presidente não cabe e ao seu partido, neste momento, acho que, politicamente, não caberia. Pois bem, então eu sugiro a você – e a mim mesmo – que usemos nossa cidadania para fazer alguma coisa.
Você tem queixa desse magistrado? Eu também tenho. Então por que não reclamamos dele? A quem? Ora, ao órgão competente, ou seja, ao Conselho Nacional de Justiça.
Ah, mas aí envolve dinheiro, envolve advogado, envolve um monte de coisas e eu não posso porque não tenho tempo, tenho medo de me prejudicar, não é minha obrigação etc., etc., etc.
Não é bem assim. Caso você não saiba, qualquer cidadão brasileiro pode representar contra um magistrado ao CNJ. É preciso advogado? Não. Qualquer cidadão pode representar ao Conselho desde que apresente petição escrita e assinada e documentos que comprovem sua identificação e endereço.
Na petição, a pessoa deve contar em detalhes o seu problema e dizer qual providência espera que seja tomada pelo CNJ, podendo encaminhar os documentos que julgar necessários para a comprovação do alegado.
Você não quer assinar esse documento? Não precisa. Basta que uma pessoa assine. Oficialmente, essa pessoa será responsável pela denúncia.
Este blogueiro, então, propõe-se a assinar como responsável. Em nome de todos. Todavia, para demonstrar que essa medida não está só na minha cabeça seria bom que um abaixo-assinado fosse juntado à representação.
Não importa se forem 100, 200 ou mil cidadãos. O importante é que não seja uma medida isolada.
Eu gostaria de representar contra Sergio Moro. Estou disposto a dar meu RG, meu CPF, meu endereço, meu título de eleitor, meu tipo sanguíneo, minha foto, o que mais, diabos, eles quiserem. A você, caberia apenas assinar um documento endossando minha reclamação. E esse documento não lhe causará consequência alguma, pois serei o responsável pela representação.
Eis uma chance de não ficarmos só na reclamação, à espera de que outros façam alguma coisa em defesa do direito de todos. Pode não dar em nada? Claro que pode. É provável que o sistema se proteja da cidadania. Porém, o que não cabe em minha cabeça é ficar assistindo impassível à democracia ser exterminada no país em que crescerão minhas netas.
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