Deirdre Fulton: 'Crime financeiro do século' não leva ninguém à prisão

Apesar das graves infrações, o governo dos Estados Unidos 'concluiu que os crimes devem ser punidos apenas com uma multa.'

Deirdre Fulton, do Common Dreams - na Carta Maior
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Enquanto alguns observadores saúdam o acordo recorde em que o Deutsche Bank terá que pagar 2,5 bilhões de dólares aos EUA e ao governo do Reino Unido por ter manipulado taxas no escândalo LIBOR, outros notam que a multa – mesmo importante – sugere que algumas instituições ainda são consideradas "grandes demais para ir para a cadeia" (too big to jail).
 
Autoridades anunciaram na quinta-feira que o maior banco alemão teria que pagar 2,5 bilhões de dólares em multas, um recorde para casos de fraude em taxa de juros, que já atingiu outros gigantes financeiros como Barclays e UBS. O delito do Deutsche Bank teria durado entre 2005 e 2011, envolvendo funcionários em Londres, Frankfurt, Nova York e Tóquio.

 
O New York Times informa que o Deutsche Bank "também acatou a incriminação de sua filial britânica, que está no centro do caso. É a mais importante instituição financeira a ter aceitado uma incriminação na longa investigação da taxa LIBOR (de London Interbank Offered rate)".
 
A taxa LIBOR é uma média do que os bancos cobram em empréstimos feitos uns aos outros. Também funciona como referência para taxas de juros para trilhões de dólares em empréstimos em todo o mundo – de hipotecas e financiamentos estudantis a cartões de crédito e derivativos complexos.
 
A decisão encerra uma investigação de sete anos sobre como algumas das maiores instituições financeiras do mundo secretamente conspiravam para manipular taxas de juro de referência em benefício próprio.
 
Mas nem todos concordam que a punição anunciada na quinta-feira está à altura daquele que tem sido chamado de “crime do século".
 
"Os agentes encontraram repetidos exemplos de manipulação durante a investigação ao banco", disse na quinta-feira Bartlett Naylor, responsável por políticas financeiras do grupo de defesa dos direitos civis americano Public Citizen.
 
"Por exemplo, eles descobriram práticas fraudulentas difundidas entre os traders como dar informações falsas sobre taxas às quais emprestavam ou tomavam emprestado de outros bancos", disse ele. "Isso estabelecia falsos parâmetros em que se baseavam as outras taxas. E prejudica o cidadão comum quando assina suas hipotecas. Agentes da lei também descobriram que o Deutsche Bank reteve e até mesmo destruiu informações referentes à investigação. No entanto, surpreendentemente, apesar da gravidade destes delitos, a governo concluiu que esses crimes devem ser punidos apenas por meio de uma multa."
 
"Este acordo, que não mandou nenhum trader para a prisão, não está à altura dos problemas identificados Para piorar, muitos dos responsáveis %u20B%u20Bpelas fraudes continuam empregados no Deutsche Bank. O Departamento de Justiça (americano) afirma que ainda pode processar indivíduos, e esperamos que persista neste objetivo”, continuou Bartlett. “Até o momento, alguns traders de outras instituições, como a Rabobank, foram condenados, mas nenhum empregado com cargos de chefia de qualquer um dos bancos envolvidos no caso LIBOR foi responsabilizado".
 
Como o jornalista Valentin Schmid aponta na Epoch Times, "o uso de informação privilegiada por investidores individuais parece algo mínimo em comparação, e muitos foram presos por 10 anos ou mais. É hora de criminosos trabalhando para os grandes bancos internacionais receberem o mesmo tratamento".
 
No Daily Mail, o colunista de finanças e economia Alex Brummer questiona se as multas e processos criminais “ocorridos tanto tempo após o evento não são como colocar trancas na porta muito tempo depois de a casa ter sido roubada”.
 
Brummer continua:
 
“Não há dúvida de que o delito continua a ocorrer, tendo provavelmente se deslocado das transações financeiras, agora fortemente reguladas, para os fundos hedge, organizações de shadow banking e similares.
 
Isso não é desculpa para acordos dóceis com os fraudadores financeiros. Até que o público veja justiça sendo feita, com banqueiros e traders despedidos, levados ao tribunal e punidos, as transgressões terríveis do mercado financeiro serão uma ferida aberta.
 
Não só os banqueiros deveriam ser condenados a longas penas de prisão, mas também os ativos obtidos de forma ilícita deveriam ser reclamados pelo Estado, como acontece com os criminosos comuns. Banqueiros que roubam são tão culpados quanto uma quadrilha de ladrões de joias”.
 
Ainda assim, como relata o Times, "o caso mostrou a conivência que reina nas mesas de negócios de Wall Street, onde bancos rivais de tempos em tempos unem forças para manipular indicadores financeiros. Segundo fontes bem informadas, o caso também é o prenúncio de ações iminentes contra bancos suspeitos de se juntar para manipular o preço de moedas estrangeiras: o Departamento de Justiça deve anunciar no próximo mês acordos de confissão com pelo menos quatro bancos: Barclays, JPMorgan Chase, Citigroup e Royal Bank of Scotland".


Tradução de Clarisse Meireles




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