Greve no Paraná: Crônica de uma assembleia no estádio
Tinha arquibancada lotada, venda de espetinho e isopor de refrigerante. O clima era de decisão. Mas não era futebol. Era assembleia.
Bernardo Pilotto, originalmente publicado no Correio da Cidadania
Pareciam… Nesta quarta-feira, 04 de março, cerca de 20.000 professores e funcionários de escola do Paraná se reuniram no estádio Durival de Britto e Silva, a Vila Capanema, em Curitiba. A votação foi quase unânime pela manutenção da greve, que desde o dia 09 de fevereiro vem sacudindo o Paraná e o Brasil.
Tinha arquibancada lotada, venda de espetinho e isopor de refrigerante. O clima era de decisão. Mas não era futebol. O que acontecia ali era a Assembleia Estadual da APP - sindicato dos educadores da rede pública do estado do Paraná!
Mas o simbolismo do momento não se deu apenas pela lembrança das assembleias que fizeram nascer uma nova forma de sindicalismo no Brasil e que foram fundamentais para a derrocada da ditadura civil-militar de 1964. A Vila Capanema também tem as suas histórias: o Paraná Clube, time que hoje usa o estádio, foi formado pela fusão do Pinheiros e do Colorado, que por sua vez tinha sido a fusão do Britânia, do Palestra Itália e do Ferroviário.
Pois bem, o Clube Atlético Ferroviário, fundado em 1930, foi o time formado pelos trabalhadores da Rede Ferroviária Federal, que tinha sua sede, no Paraná, ao lado de onde está construído o Vila Capanema (inaugurada em 1947). Era um time humilde, de trabalhadores, que conseguiu ser campeão paranaense por 8 vezes.
Também é nesta região da cidade que se formou a primeira escola de samba do estado, a Colorado. Comandados por Maé da Cuíca, os bambas da Vila Tassi (local que ficava na região do estádio e que foi destruída pela especulação imobiliária) fizeram história na cidade e foram um símbolo de resistência cultural. Muitos trabalhadores e torcedores do Ferroviário eram também membros da Colorado.
E é essa força de resistência, dos trabalhadores das assembleias da Vila Euclides e dos ferroviários e bambas da Vila Capanema e da Vila Tassi, que parece estar presente na greve dos educadores do Paraná desde o seu início. Foi assim que eles derrotaram uma “base parlamentar aliada invencível”, ocupando a Assembleia Legislativa por 2 vezes. É essa força que os faz enfrentar atualmente a decisão da (in)justiça que decretou a greve ilegal.
Com a manutenção de quase 100% das escolas paradas, o governo estadual começa a sinalizar que vai reabrir a mesa de negociação. Muitas coisas estão pendentes, como o pagamento de progressões e promoções que estão atrasadas, em muitos casos há mais de 1 ano. E, além das escolas, também permanecem paralisadas as 7 universidades estaduais (UEM, UEM, UEPG, Unespar, UENP, Unioeste e Unicentro) e o Detran. Até o momento, apenas a greve dos servidores da Defensoria Pública foi encerrada, neste caso com vitória para os trabalhadores.
Parece-nos que a força das greves paranaenses tem contagiado os trabalhadores de outros estados brasileiros. Porque a dificuldade que vivemos por aqui, com atrasos de salário, calotes do governo e ameaças de retirada de direitos, é uma realidade nacional.
Também nos fica evidente que a greve “extrapolou” suas pautas. Além das reivindicações mais específicas da educação, os trabalhadores conseguiram derrotar o método da “comissão geral” na Assembleia Legislativa, o popular tratoraço. Esse método permitia que um projeto fosse votado de um dia para o outro, sem passar pelas comissões e pelo rito normal de tramitação. Depois dos protestos, o tratoraço foi retirado do regimento da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), por unanimidade. Outra pauta que também entrou em cena é a democratização das comunicações, fruto especialmente do fato de que o SBT local (a Rede Massa) tem como dono o apresentador Ratinho, pai de Ratinho Jr., deputado estadual licenciado e Secretário Estadual de Desenvolvimento Urbano.
O dia 04 de março foi histórico. Pra quem estava acostumado a ir a jogos de futebol em Curitiba ver o seu time tomar goleadas (sim, o Flamengo tem muito azar por aqui), a assembleia de hoje certamente vai trazer um novo significado sobre o que é sair vitorioso de um estádio de futebol.
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Bernardo Pilotto, sociólogo e técnico-administrativo da UFPR, foi candidato a governador do Paraná em 2014 pelo Psol.
Para quem já leu alguma coisa sobre nossa história contemporânea ou sobre a história das lutas sindicais em nosso país, certamente são marcantes as cenas das assembleias realizadas pelos metalúrgicos do ABC Paulista, no final dos anos 1970, que foram capazes de lotar o estádio da Vila Euclides em São Bernardo do Campo. Para quem nasceu depois dessa época, as assembleias de trabalhadores capazes de lotar um estádio pareciam destinadas aos livros e filmes.
Pareciam… Nesta quarta-feira, 04 de março, cerca de 20.000 professores e funcionários de escola do Paraná se reuniram no estádio Durival de Britto e Silva, a Vila Capanema, em Curitiba. A votação foi quase unânime pela manutenção da greve, que desde o dia 09 de fevereiro vem sacudindo o Paraná e o Brasil.
Tinha arquibancada lotada, venda de espetinho e isopor de refrigerante. O clima era de decisão. Mas não era futebol. O que acontecia ali era a Assembleia Estadual da APP - sindicato dos educadores da rede pública do estado do Paraná!
Mas o simbolismo do momento não se deu apenas pela lembrança das assembleias que fizeram nascer uma nova forma de sindicalismo no Brasil e que foram fundamentais para a derrocada da ditadura civil-militar de 1964. A Vila Capanema também tem as suas histórias: o Paraná Clube, time que hoje usa o estádio, foi formado pela fusão do Pinheiros e do Colorado, que por sua vez tinha sido a fusão do Britânia, do Palestra Itália e do Ferroviário.
Pois bem, o Clube Atlético Ferroviário, fundado em 1930, foi o time formado pelos trabalhadores da Rede Ferroviária Federal, que tinha sua sede, no Paraná, ao lado de onde está construído o Vila Capanema (inaugurada em 1947). Era um time humilde, de trabalhadores, que conseguiu ser campeão paranaense por 8 vezes.
Também é nesta região da cidade que se formou a primeira escola de samba do estado, a Colorado. Comandados por Maé da Cuíca, os bambas da Vila Tassi (local que ficava na região do estádio e que foi destruída pela especulação imobiliária) fizeram história na cidade e foram um símbolo de resistência cultural. Muitos trabalhadores e torcedores do Ferroviário eram também membros da Colorado.
E é essa força de resistência, dos trabalhadores das assembleias da Vila Euclides e dos ferroviários e bambas da Vila Capanema e da Vila Tassi, que parece estar presente na greve dos educadores do Paraná desde o seu início. Foi assim que eles derrotaram uma “base parlamentar aliada invencível”, ocupando a Assembleia Legislativa por 2 vezes. É essa força que os faz enfrentar atualmente a decisão da (in)justiça que decretou a greve ilegal.
Com a manutenção de quase 100% das escolas paradas, o governo estadual começa a sinalizar que vai reabrir a mesa de negociação. Muitas coisas estão pendentes, como o pagamento de progressões e promoções que estão atrasadas, em muitos casos há mais de 1 ano. E, além das escolas, também permanecem paralisadas as 7 universidades estaduais (UEM, UEM, UEPG, Unespar, UENP, Unioeste e Unicentro) e o Detran. Até o momento, apenas a greve dos servidores da Defensoria Pública foi encerrada, neste caso com vitória para os trabalhadores.
Parece-nos que a força das greves paranaenses tem contagiado os trabalhadores de outros estados brasileiros. Porque a dificuldade que vivemos por aqui, com atrasos de salário, calotes do governo e ameaças de retirada de direitos, é uma realidade nacional.
Também nos fica evidente que a greve “extrapolou” suas pautas. Além das reivindicações mais específicas da educação, os trabalhadores conseguiram derrotar o método da “comissão geral” na Assembleia Legislativa, o popular tratoraço. Esse método permitia que um projeto fosse votado de um dia para o outro, sem passar pelas comissões e pelo rito normal de tramitação. Depois dos protestos, o tratoraço foi retirado do regimento da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), por unanimidade. Outra pauta que também entrou em cena é a democratização das comunicações, fruto especialmente do fato de que o SBT local (a Rede Massa) tem como dono o apresentador Ratinho, pai de Ratinho Jr., deputado estadual licenciado e Secretário Estadual de Desenvolvimento Urbano.
O dia 04 de março foi histórico. Pra quem estava acostumado a ir a jogos de futebol em Curitiba ver o seu time tomar goleadas (sim, o Flamengo tem muito azar por aqui), a assembleia de hoje certamente vai trazer um novo significado sobre o que é sair vitorioso de um estádio de futebol.
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Bernardo Pilotto, sociólogo e técnico-administrativo da UFPR, foi candidato a governador do Paraná em 2014 pelo Psol.
Créditos da foto: Bernardo Pilotto
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