A justiça poética de ver Eduardo Cunha no pântano da Lava Jato

Teve o que mereceu
Teve o que mereceu
Há uma espécie de justiça poética no vendaval que arrastou o deputado Eduardo Cunha para o pântano da Lava Jato.
Pouco antes de ganhar o noticiário, ele se apressara em avisar, pelo Twitter, que era terminantemente contra qualquer espécie de regulação de mídia.

Provavelmente ele imaginara estar ganhando blindagem – e louvação — das grandes empresas de jornalismo ao adotar uma postura tão servil a elas e tão contrária à sociedade.
A reportagem da Folha que o colocou na Lava Jato deve ter sido, para ele, um choque extraordinário.
Você pode imaginá-lo dizendo: “Ei, amigos, eu estou do lado de vocês!”
Mas onde mais se percebe a justiça poética do caso é na argumentação de Cunha também no Twitter sobre o mérito jornalístico da Folha.
Num português manco de quem ou não sabe escrever ou está terrivelmente ansioso, Cunha produziu, sem querer, uma vigorosa defesa da tese de que as regras e a legislação do jornalismo devem ser revistas.
Ele criticou o fato de a Folha ter dado uma manchete com base numa declaração – sem prova.
Alguém vazou para a Folha que um participante da roubalheira – um certo “Careca” — dissera ter entregado a Cunha 1 milhão de reais desviados da Petrobras.
Jornalisticamente, Cunha tem um ponto.
Num mundo menos imperfeito, a imprensa não publicaria uma acusação daquelas sem provas. Por uma razão básica: pode ser mentira, e você está destruindo uma reputação.
Um editor nos Estados Unidos ou na Inglaterra não publicaria este tipo de coisa, não só por razões jornalísticas – mas porque haveria fatalmente problemas na Justiça, e a perspectiva de indenização pesada caso não fossem apresentadas provas.
Mas no Brasil as coisas são bem diferentes.
A imprensa, certa da impunidade jurídica, se acostumou a publicar acusações pesadíssimas contra aqueles de que não gosta – particularmente, contra os líderes do PT.
O momento supremo disso foi uma capa da Veja que trazia um dossiê – fajuto, se soube logo depois — segundo o qual Lula tinha contas no exterior.
Mesmo admitindo no texto não ter conseguido provar nada, a Veja foi adiante e publicou o dossiê – uma contribuição a mais para criar em seus leitores a imagem de um Lula corrupto e riquíssimo.
A Justiça nunca foi uma barreira contra este tipo de delinquência jornalística. A profusão de fotos em que aparecem juízes da Suprema Corte com jornalistas e donos das grandes empresas de mídia é reveladora da amizade cúmplice que une partes que deveriam se vigiar.
Como o alvo da mídia sempre foram líderes e partidos de esquerda, os políticos conservadores jamais se incomodaram com nada dos sucessivos “escândalos” sem prova.
Na verdade, sempre gostaram.
Eles só começaram a achar esquisito agora, quando o noticiário trouxe outros nomes que não os suspeitos de sempre.
Logo depois de Eduardo Cunha, apareceu na mesma situação, sob idêntica acusação, Anastasia, invenção de Aécio Neves.
Chega a ser engraçado ver Aécio dizer que é uma “covardia” publicar acusações sem prova contra Anastasia, ele que jamais tomou nenhum cuidado antes de usar contra adversários denúncias não comprovadas.
Toda sociedade avançada tem regras claras e rígidas que impedem que sejam publicadas acusações sem provas.
O Brasil, não.
Qualquer tentativa de discussão é cinicamente rechaçada, por pessoas como Eduardo Cunha, como uma “ameaça de censura”.
Talvez Cunha, agora, pense melhor a respeito da necessidade de debater os limites da mídia.
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Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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