O PAPEL DE BERZOINI NO GOVERNO
por Paulo Moreira Leite
Para petistas, indicação confirma importancia da democratização da mídia no 2o. mandato
A indicação de Ricardo Berzoini para ocupar o Ministério das Comunicações, vista como praticamente certa em Brasilia, aparece hoje como o principal rosto do Partido dos Trabalhadores no ministério do segundo mandato.
Hoje ministro de Relações Institucionais, Berzoni é um partidário assumido da democratização dos meios de comunicação. Bandeira histórica do Partido, a democratização ganhou corpo a camadas muito mais amplas da sociedade depois da campanha de 2014, quando vários indicadores demonstraram que os principais grupos de mídia atuaram abertamente para favorecer os adversários de Dilma.
Bancário de origem profissional, Berzoini fez sua formação numa categoria que tem uma tradição de procurar formas próprias de comunicação com os trabalhadores e o conjunto da sociedade. Ao lado dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, os bancários de São Paulo foram pioneiros na exibição de programas em emissoras de rádio e TV. Também têm uma imprensa que costuma tratar de assuntos de interesse geral do cidadão, a rede Brasil Atual.
Entre os dirigentes do PT, onde este assunto é discutido com frequência e no detalhe, a indicação de Berzoini é vista como um sinal da importância que Dilma Rousseff irá atribuir a democratização da mídia durante o segundo mandato. As várias manifestações de Dilma a respeito sinalizam uma mudança em relação ao que se passou entre 2011-2015, quando o assunto ficou na geladeira política dos temas que não eram falados nem discutidos.
Em seu quarto mandato como deputado — e no terceiro ministério depois da chegada de Lula ao Planalto — Berzoini mostrou em 2003, ao liderar os debates sobre a reforma da Previdência, que é capaz de manter opiniões firmes em debates delicados. Manteve-se leal ao governo que ajudou a eleger e, ao mesmo tempo, assumiu uma proposta que era rejeitada pelo sindicalismo onde se formou.
A avaliação é que saiu-se bem, considerando o tamanho das dificuldades encontradas. Se a reforma da Previdência serviu de motivo para um grupo de parlamentares da esquerda do PT formarem o PSOL, e até hoje é um travo real e importante nas relações entre o Planalto e os sindicatos, também produziu um desgaste menor do que a maioria dos analistas profetizavam. Candidato a um novo mandato de deputado em 2006, Berzoini teve mais votos do que no pleito anterior.
Não se faz ideia, hoje, de qual será a linha do governo Dilma no debate sobre a democratização dos meios de comunicação. A presidente já adiantou que pretende abrir o debate no segundo semestre de 2015.
Há certeza de que qualquer avanço irá envolver disputas duríssimas, a começar pela oposição dos principais grupos de comunicação à maioria das mudanças.
Só para se ter uma ideia: nem durante o regime militar elas se sentiram obrigadas a cumprir a legislação em vigor na época e que permanece basicamente a mesma desde então. Assinado pelo presidente Castelo Branco, o primeiro governante do pós-64, o decreto 236/67, que define restrições ao monopolio, a formação de redes, protege a produção local e assim por diante, nunca foi obedecido de forma integral. Passaram-se 47 anos desde a publicação do decreto — meio século, do ponto de vista histórico. E nada.
Em 1988, na Constituinte, os artigos de caráter progressista foram neutralizados pela bancada conservadora, que conseguiu votos para garantir que só entrassem em vigor depois de definidos em ” lei ordinária.” A partir daí, os parlamentares dispostos a qualquer mudança jamais tiveram força para colocar o assunto em plenário.
Nos anos seguintes, o costume de alugar horários para o pregação religiosa tornou-se uma banalidade.
Garantia elementar do cidadão, o Direito de Resposta sempre foi cumprido de modo parcimonioso, até que foi abolido — pura e simplesmente. (Aprovado pelo Senado, um projeto do senador Roberto Requião aguarda chance de ser votado pela Câmara para entrar em vigor. Ninguém sabe quando irá acontecer. Até lá, Escolas de base e outras obras-primas do mau jornalismo, que hoje se especializou em fabricar trapaças políticas, terão trânsito livre para se manifestar.
As principais empresas de comunicação possuem uma numerosa bancada de apoio no Congresso. A regra é uma permuta: recebem um tratamento favorável nos tele-jornais em troca de uma militancia fiel nos bastidores.
Dezenas de parlamentares possuem concessões de rádio e TV que funcionam como currais eleitorais — e não têm a menor disposição de fazer qualquer concessão em posição de confortável monopólio. Mas há uma diferença entre elas, dizem dirigentes do Partido dos Trabalhadores que participaram de uma Conferência de Comunicação Promovida durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva. O grupo maior, a TV Globo, que possui mais de uma centena de emissoras afiliadas, lidera a postura mais instransigente e inflexível. As redes menores se mostram, ao menos no plano da teoria, mais abertas para discutir e dialogar. A Band acompanhou os trabalhadores da Conferencia, do início ao fim.
As outras nem compareceram, o que já demonstra a dificuldade para levar um debate em termos democráticos, em cujo centro se encontram concessões públicas de rádio e tv.
O governo Dilma encaminhar essa questão partir de uma estratégia parecida com aquela que se seguiu na “reforma política”. Após os protestos de junho de 2013, Dilma jogou o assunto para o debate entre o conjunto da população brasileira, permitindo uma discussão no conjunto sociedade.
É dali, particularmente, que o Planalto espera apoio. Tudo o que o Planalto deseja é evitar um ambiente de conflagração semelhante ao que ocorreu na Argentina onde Cristina Kirschner e o grupo Clarin se confrontaram em ambiente de guerra civil, que deixou um desgaste inversamente proporcional em relação aos progressos obtidos.
A primeira tarefa será vencer a guerra de propaganda. Num esforço para fugir de um debate necessário, as empresas de comunicação construíram a lenda de que o governo prentende interferir no conteúdo da mídia. Bobagem: o que se pretende é trazer para o Brasil um debate civilizado, que ajudou a desenvolver os meios de comunicação em países de maior tradição liberal, como os Estados Unidos e a Inglaterra.
O país não tem o que temer num debate que coloca em questão, na verdade, a sobrevivência de um sistema essencialmente autoritário, que projeta um pensamento único sobre o destino do Brasil e dos brasileiros.
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