Lula: ‘Catar papelão na rua é muito mais digno do que jogar’
Ex-presidente enaltece catador de recicláveis e pede que categoria cobre poder público por políticas de coleta seletiva. Haddad assegura que mecanização de atividade não afetará ocupação no setor
por Rodrigo Gomes, da RBA
por Rodrigo Gomes, da RBA
RICARDO STUCKERT/INSTITUTO LULA
São Paulo – O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou hoje (1º) que, se morresse agora, estaria feliz pela organização a que chegaram os catadores de materiais recicláveis nesses 12 anos, contra todos os que os desprezavam. “Catar papelão na rua é muito mais digno do que jogar”, afirmou, destacando a importância do trabalho ambiental dos catadores, ainda pouco reconhecido no país. "A profissão de vocês não é menor que a do médico, nem que a do engenheiro", completou, na abertura da Expocatadores 2014, em São Paulo.
Lula ressaltou que os trabalhadores não devem se deixar levar por discursos antipolítica e que se mantenham firmes em sua organização. “A gente só faz mesmo se a gente for cobrado. O mundo é assim”, explicou, comentando que tanto a presidenta quanto o prefeito receberão muitas reivindicações. Mas depois vão a outras reuniões e vão receber mais pedidos. “O mais esperto é o que ganha. E quem é o mais esperto? É o que cobra”, completou.
O ex-presidente agradeceu o reconhecimento recebido dos presentes à feira, mas disse que não fez nada mais que a sua obrigação. Por onde ele andou foi seguido por uma multidão pedindo fotos e abraços. “Vocês pegaram as oportunidades com as duas mãos. Vocês estão dando uma lição de cidadania.” Lula ressaltou que muito do que foi desenvolvido na questão da coleta seletiva e da reciclagem no país foi graças à organização dos catadores.
Este é o quinto evento dos catadores em São Paulo, que reúne trabalhadores do setor de 17 países latino-americanos. Na feira, os profissionais discutem políticas públicas, apresentam e conhecem modelos de coleta seletiva, fazem negócios e projetam ações para o ano seguinte. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) começou a ser discutida por eles na primeira edição do evento, em 2009.
Mecanização
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), garantiu que a mecanização da coleta de materiais recicláveis, iniciada este ano pela administração, não vai causar desemprego entre os trabalhadores do setor. Segundo o prefeito, o objetivo da gestão é incluir também os catadores que não estão organizados em cooperativas.
“Essa agenda é prioridade da prefeitura. E nós vamos ser um exemplo de coleta seletiva para o Brasil e a América Latina, em parceria com os catadores. Nosso programa é socioambiental. Respeita o meio ambiente e, acima de tudo, respeita o ser humano.”
O prefeito já inaugurou duas centrais mecanizadas de triagem de materiais recicláveis, uma na Ponte Pequena, zona norte, em junho, e outra em Santo Amaro, na zona sul, em julho. O objetivo é abrir mais duas, nas zonas leste e oeste da capital. Assim espera-se coletar e mandar para a reciclagem 10% de todo o descarte da cidade. “Não queremos os lixões. Não queremos incineração. O que nós queremos é uma economia sustentável”, ressaltou.
Cada central pode processar até 250 toneladas de material por dia, o equivalente a todoo trabalho manual feito diariamente pelas 21 cooperativas parceiras da prefeitura. Hoje são 75 distritos com coleta, mas só em 14 ela é realizada em todo o território. Dez novos distritos receberam coleta seletiva este ano. A ideia da prefeitura é levar a coleta seletiva a 83 dos 96 distritos até 2016, sendo 40 deles em todo o território.
“Vamos começar a bater de porta em porta e explicar o que é a coleta seletiva para cada cidadão de São Paulo”, disse o prefeito.
Está prevista para quarta-feira (3) a presença da presidenta Dilma Rousseff (PT) na Expocatadores. Segundo Haddad, Dilma vai oficializar, junto com a diretoria do BNDES, recursos destinados para a melhoria das condições de trabalho nas centrais manuais.
Na avaliação dos catadores, a situação melhorou nos últimos anos e estão ocorrendo avanços na gestão municipal. “Antes, o catador era o morador de rua, catava para vender. Hoje não. São famílias organizadas, que têm investimento, estão comprando casa. Estão em uma situação melhor. Para nós é importante isso”, defendeu o coordenador nacional do Movimento da População em Situação de Rua, Anderson Lopes Miranda. No entanto, algumas reivindicações serão apresentadas para Haddad e à presidenta.
Entre elas, segundo a militante Telma Maria da Silva, do Movimento Nacional dos Catadores de Material Reciclável, a remuneração por serviços ambientais aos trabalhadores pela ação de coletar o material reciclável e o direito à aposentadoria são as principais pautas. “Hoje, na capital, os trabalhadores ganham somente pelo que é vendido. Mas a medida já está sendo avaliada pela prefeitura, que precisa colocar em prática”, afirmou. O pagamento já é feito em cidades como Ourinhos e Piracicaba, no interior paulista.
O secretário municipal de Serviços, Simão Pedro, afirmou que a medida está sendo aplicada nas centrais mecanizadas e deve ser estendida a todo o conjunto dos catadores paulistanos. A ideia é não mais fazer convênios com as cooperativas, caso em que elas devem arcar com a infraestrutura, mas contratação para prestação de serviços. “A perspectiva é que a médio prazo toda a relação da prefeitura com os catadores se dê por esses contratos”, explicou.
A Expocatadores 2014 termina nesta quarta, no Pavilhão de Exposições do Anhembi, na zona norte de São Paulo.
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