Fórum21: um novo espaço para o debate progressista

Em debate do Fórum21, setores da sociedade civil discutiram como atuar diante da desestabilização orquestrada pelos cartéis financeiro e midiático.

Dario Pignotti
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São Paulo - Transcorridos apenas 48 dias desde a reeleição da presidenta Dilma Rousseff, intelectuais, militantes de partidos de esquerda e movimentos sociais, sindicalistas e ativistas midiáticos participaram do encontro de lançamento do Fórum 21, em que se discutiu como atuar diante da desestabilização orquestrada pelos cartéis financeiro e midiático.



 “A disposição da direita em promover o acirramento da luta ideológica e política convoca as forças da esquerda à mobilização para o debate e a ação. É preciso disputar a hegemonia ideológica na sociedade. Para tanto, será imprescindível ampliar o nível de politização de uma sociedade que reivindica mais participação, ao mesmo tempo em que carece de canais públicos de diálogo e reflexão", fiz a carta de princípios do Fórum 21.
 
"Cabe às forças progressistas começar pelo que é mais evidente: romper os limites do diálogo no seu próprio campo. A articulação para a troca de ideias daqueles que defendem a justiça social e a soberania popular é essencial à arregimentação de forças mais amplas para os embates que virão", consta no documento que deu início ao encontro do qual um dos primeiros oradores foi Juca Ferreira, secretário de Cultura de São Paulo.

Ferreira falou sem eufemismos sobre a necessidade de fazer uma autocrítica dos governos do PT e recomendou estabelecer um diálogo mais estreito com os movimentos sociais e a juventude, que no segundo turno emitiram um “voto crítico” a Dilma diante da ameaça que representava a candidatura de Aécio Neves.
 
“Temi que fôssemos derrotados nas eleições... Acho que a esquerda tem que assumir sua responsabilidade... Acho que, nesses anos, nos aproximamos ao modus operandi da direita, precisamos de uma revisão programática. Se não a fizermos rápido, podemos perder em 2018, mesmo que o candidato seja o Lula”, alertou Ferreira, que falou na mesa “Participação Social e Democracia”.

O seminário ocorreu na última segunda-feira em São Paulo, horas depois de a presidenta receber no Palácio do Planalto uma delegação do MST que rechaça a nomeação de Kátia Abreu, líder da CNA, para o Ministério da Agricultura.

Na mesma segunda-feira à noite, a presidenta elogiou a dirigente ruralista Kátia Abreu na sede da CNA, onde o MST exibiu um cartaz dizendo: “Dilma, nós votamos em você. Não merecemos a Kátia Abreu no Ministério da Agricultura”.

"Democratizar os meios de Comunicação" foi o segundo painel, que contou com a participação do professor Venício Lima, da jornalista Bia Barbosa e do pesquisador João Feres Junior, sob a coordenação do jornalista Rodrigo Vianna.

Venício Lima, sociólogo, professor da Universidade de Brasília e autor de livros sobre meios de comunicação e eleições, mencionou os “avanços de 2008”, quando a Secretaria de Comunicações estabeleceu novos critérios para a atribuição da publicidade do Estado, começando a fazer anúncios em publicações e rádios regionais.

Apesar disso, "na prática, (a continuidade de direcionamento dessas verbas a Globo, Folha, Veja) provoca a reafirmação dos mesmos oligopólios que controlam a mídia no Brasil", afirmou Lima, que também lamentou a “tragédia diária” que representa o discurso desestabilizador dos grupos de propriedade concentrada.

Ele também fez alusão à manobra golpista realizada pela Veja em 23 de outubro, em uma edição antecipada na Internet, cuja capa publicou informações falsas para prejudicar a candidatura de Dilma Rousseff nas eleições de domingo, dia 26 de outubro.

Lima comentou como a revista do grupo Abril continuou divulgando essa infâmia antidilmista até o sábado, dia 25, apesar da proibição da Justiça Eleitoral, que a considerou como uma manobra eleitoral a favor de Aécio Neves.

Lamentavelmente, e apesar desse ataque golpista criticado pela própria Dilma e pelo PT, o governo renovará sua cota publicitária com a editora abril no ano que vem, disse o especialista.

O dinheiro da publicidade estatal não deve ser alocado somente nos meios de maior circulação. Esses fundos públicos devem contribuir para financiar os meios com “baixos recursos” para favorecer a “pluralidade e a diversidade”, disse Lima, citando um documento elaborado pela União Europeia.

Também é preciso dar mais respaldo à Empresa Brasileira de Comunicação e aos demais meios públicos, afirmou Lima, coincidindo com o ponto de vista defendido por Bia Barbosa.

Infelizmente, logo após sua vitória, a presidenta concedeu entrevistas à Globo, à Record e à Bandeirantes, “mas não foi à TV Brasil”, disse Lima.

Bia Barbosa, representante do coletivo Intervozes, resgatou o trecho em que, durante a recente campanha eleitoral, Dilma falou da “regulação econômica” da mídia, o que mostra um avanço ante a posição que ela havia defendido em 2010, quando disse “que o único controle é o controle remoto”.

Bia afirmou que existe um falso debate sobre a necessidade da regulação pública dos meios de comunicação, que a direita intencionalmente associa à ideia de censurar.

“A regulação não é para calar os meios privados... a regulação é para garantir que haja mais pluralidade”, explicou Bia.

Em outro momento de sua intervenção, lamentou que, “passados cinco anos da Confecom (Conferência Nacional de Comunicações), não temos o que comemorar”, pois as recomendações elaboradas naquele foro foram ignoradas pelo governo, e não se avançou nas políticas de comunicação.

Bia disse que ainda não se podem fazer previsões sérias sobre qual será a política de meios de comunicação do próximo governo, pois não se conhece o nome do futuro ministro, ao passo que existem rumores sobre a possibilidade de a SECOM passar a fazer parte do Ministério das Comunicações.

A especialista em meios de comunicação falou do “coronelismo eletrônico” imperante no Brasil e do lobby ativo desempenhado pela bancada dos donos de meios no Congresso, apesar de se informar pouco a respeito disso, além de ter ressaltado a necessidade de as licenças de TV não serem renovadas automaticamente, como ocorre na atualidade.

Joao Feres Jr, coordenador do Manchetômetro, produzido pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública, afirmou que, após meses de estudos sobre a cobertura da Folha, d'O Globo, do Estadão e do Jornal Nacional, pode-se afirmar que houve um discurso orgânico “de claro viés antidilma e anti-PT nessa campanha, e também na de 2010”.

“Sempre, em todas as eleições, o que predomina é o viés fundamentalmente anti-PT”, disse Feres.

A imprensa tradicional diz que critica o governo petista porque seu papel é exercer um suposto “contrapoder”, mas isso não se comprova na prática, já que, nas eleições de 1998, a cobertura foi abertamente favorável a FHC e contrária a Lula, disse o responsável pelo Manchetômetro.


“Eu acho que o golpe iniciado pela Veja continua funcionando, com a participação dos grandes grupos. Agora, existe uma espécie de pensamento único na mídia para hostilizar o governo e na cobertura do que está acontecendo na Petrobras”, afirmou Feres em conversa com a Carta Maior.

O caso da Petrobras tem vários ângulos de abordagem, como a participação das empreiteiras, o interesse em modificar a política energética do governo e os fatores geopolíticos que estão em jogo, mas a mídia se concentra principalmente em “hostilizar” a empresa petroleira nacional e o governo, defendeu Feres.

Na terça-feira, dia 16, os jornais da santíssima trindade conservadora davam razão a Feres, com suas capas escritas praticamente com as mesmas palavras.

“Ações da Petrobras têm o menor valor em mais dez anos”, foi a principal manchete da Folha.


“Ações da Petrobras caem 9,9% e atingem o menor valor em dez anos”, publicou o Estadão, ao passo que O Globo escreveu em sua primeira página: “Ações da Petrobras desabam e são suspensas na Bolsa”.

O caso da Petrobras e seu impacto no próximo governo também foi um dos assuntos abordados pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo na mesa “Justiça Social e Desenvolvimento Econômico”.

“Estou observando uma tendência na sociedade brasileira de achar que não tem importância em destruir a Petrobras e as empreiteiras. Só que elas são responsáveis por uma parcela muito importante do investimento no país”, defendeu Belluzzo, que também vislumbrou um cenário econômico “difícil” para 2015.

Uma análise semelhante à de Beluzou foi formulada pelo professor Pedro Paulo Bastos, da UNICAMP, para quem o ajuste fiscal do próximo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pode desembocar em uma recessão.

Belluzzo, Bastos e Leda Paulani manifestaram suas críticas ao prisma neoliberal que permeia a cobertura midiática da realidade econômica e, em particular, da crise na Petrobras.

“Pelo discurso midiático, existe corrupção, então é preciso tirar o dinheiro ‘dessa gente’, diminuir o Estado”, opinou a doutora em economia Leda Paulani, ao falar no painel que pôs fim a quase 6 horas de debate no Sindicato dos Engenheiros de São Paulo.


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