Reforma política: itens a serem modificados
Por Wadih Damous (*)
Na Carta Maior
A presidente Dilma Roussef, logo em seu primeiro
pronunciamento depois de
conhecido o resultado eleitoral, reafirmou seu compromisso
com a realização de
uma reforma política. Isso se explica: a modificação das
regras que norteiam o
funcionamento das eleições e dos partidos pode aperfeiçoar,
e muito a democracia
no país.
Mas a reforma política não é uma tarefa simples. A rigor,
ela não é exatamente
uma proposta, mas um tema. Nele, cabem as mais diversas
sugestões. Umas
boas, outras, nem tanto. Para que se tenha uma ideia, até
mesmo a proposta de
volta à monarquia – que não passa pela cabeça de alguém de
bom senso - poderia
ser apresentada no debate. E, se todos concordam em que a
reforma política é
necessária, as divergências se afloram quando as propostas
começam a ser
explicitadas.
A primeira questão essencial, ao se tratar de reforma
política, é a mudança das
formas de financiamento das campanhas e dos partidos, de
forma a coibir a
gigantesca influência do poder econômico nas eleições.
Durante muito tempo a esquerda defendeu o financiamento
público exclusivo, com
o argumento de que isso poderia inibir o toma-lá-dá-cá. E,
por isso, no fim das
contas acabaria mais barato para a sociedade do que o atual
sistema em que
muitos dos eleitos acabam retribuindo a ajuda que receberam
na campanha de
formas que acabam saindo caro para o poder público.
Isso não deixou de ser verdade, mas a proposta perdeu força.
Dado o desgaste dos
políticos, a opinião pública tenderia a rechaçar a hipótese
de que se dê mais
dinheiro para partidos ou campanhas eleitorais. No lugar
dessa sugestão, surgiu1
outra, essa sim capaz de ser bem compreendida pela
sociedade: limitar os
financiamentos de pessoas físicas e impedir os
financiamentos de empresas.
Um conjunto de entidades, capitaneadas pela OAB e a CNBB,
apresentou proposta
ao STF para que fossem proibidas doações de pessoas
jurídicas a candidatos ou
partidos. A proposta está praticamente aprovada, pois seis
dos 11 integrantes do
STF já votaram a favor, o que garantiria a aprovação. No
entanto, o ministro Gilmar
Mendes pediu vistas do processo, supostamente para preparar
melhor seu voto.
Com isso, a votação foi interrompida. Até que Gilmar devolva
o processo, está tudo
parado. De qualquer forma, mais dia, menos, dia as doações
de empresas
acabarão proibidas. Isso já será um importante passo para
coibir a influência do
poder econômico nas eleições.
Outra questão que deverá ser tratada por uma reforma
política digna deste nome é
a proporcionalidade na representação da Câmara dos
Deputados. A legislação
determina um limite máximo de 70 e um piso de oito
representantes por estado.
Isso distorce a representação, que passa a não ser
proporcional ao eleitorado de
cada unidade da Federação. São Paulo, o estado mais
populoso, tem a
representação rebaixada para o teto de 70 deputados. Acre,
Amazonas, Amapá,
Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte,
Rondônia, Roraima,
Sergipe e Tocantins, que, pela proporcionalidade, teriam
direito a menos de oito
deputados federais, acabam elegendo os oito, que é o piso
legal. Essa
injustificável distorção na representação dos eleitores na
Câmara em que ser
corrigida.
Ainda no que se refere ao Congresso, há a questão do Senado,
cuja existência
agrava a distorção na representação popular. Nele, cada
estado tem três
representantes, se trate de um estado com grande eleitorado,
como São Paulo ou
Minas, ou com eleitorado pequeno, como Roraima ou Rondônia.
A justificativa para a existência do Senado é que ele
representa a federação. Só
que, na prática, a Casa funciona como uma câmara revisora e
todos os projetos
aprovados pelos deputados têm que passar por ela para se
transformarem em lei.
Por isso, uma reforma política digna desse nome deve
extinguir o Senado ou, pelo
menos, restringir as suas funções, para que ele se manifeste
apenas em assuntos
que digam respeito à Federação.
Outro debate necessário é sobre a forma da eleição
proporcional (para deputados
ou vereadores). O sistema atual transforma os candidatos de
cada partido em
adversários entre si e enfraquece os partidos. A alternativa
anteriormente
apresentada previa que cada partido apresentaria uma lista
fechada e os eleitores
votariam na lista partidária. Dependendo do número de votos,
seria eleita certa
quantidade de candidatos da lista na ordem em que eles
fossem apresentados. O
sistema fortaleceria os partidos, mas deixaria nas mãos das
direções de cada
partido a escolha dos eleitos, fortalecendo a burocracia
partidária.
Surgiu, porém, uma proposta que resolve essa questão: a
realização das eleições
proporcionais em dois turnos. Segundo esse modelo, sugerido
pela OAB, a CNBB e
outras entidades, a eleição de deputados federais e
estaduais e de vereadores
passaria a ser feita em dois turnos. No primeiro, o eleitor
escolheria um partido; no
segundo, já definido o número de vagas a que cada legenda
teria direito, com base
na votação recebida no primeiro turno, o voto seria dado num
nome, a partir de
uma lista apresentada por cada partido com o dobro de
candidatos em relação ao
número de vagas a que o partido tem direito.
Esse modelo fortaleceria os partidos, ao instituir o voto em
lista, mas não deixaria
nas mãos das burocracias partidárias a escolha dos eleitos.
E ainda acabaria com um problema que ocorre hoje, quando
milhares de candidatos
disputam cada vaga, confundindo a cabeça dos eleitores e
tornando o horário
eleitoral um mosaico de excentricidades.
(*) Advogado
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