Luis Nassif: Se Levy tocar, Dilma dança

Ministérios são locais de acertos políticos. Sem minimizar a competência técnica, é onde se montam as alianças com partidos e grupos de interesse - dos setores econômicos aos sociais.
Não se governa isolando-se em uma frente única - seja de esquerda ou de direita.
Mas há uma área crucial que é a econômica. É por aí que se define o ritmo do governo. De certo modo, é o gestor econômico que seleciona as prioridades, não apenas nos limites orçamentários, mas nos critérios de cortes.

Aparentemente, DIlma Rousseff desistiu de ser a solista da economia. Faz bem. Mas não pode abrir a mão da regência. E deve conter sua principal característica: a dos gestos heróicos.
Quando assumiu, pretendeu dar um choque na inflação. Derrubou a atividade econômica.
Depois, decidiu dar um choque nos juros. Trouxe a taxa Selic para razoabilíssimos 7,5% ao ano. Ao primeiro sinal de inflação (provocada por choques internacionais em preços de alimentos), piscou e resolveu dar novo choque na inflação.
Quando o PIB arriou novamente, resolveu dar um choque de crescimento. E arrebentou com as contas públicas.
A próxima etapa da presidente dependerá de quem colocar na Fazenda - que é o MInistério que comanda de fato os instrumentos macroeconômicos.

Os perfis de executivos

Vamos entender melhor perfis de executivos.
Há o CEO, o executivo com visão estratégica da empresa, que sabe medir a relevância de cada área, definir prioridades, montar um plano estratégico e colocá-lo em operação.
E há o financeiro ampliado. É o executivo com bom domínio sobre as contas, capaz de analisar os planos do CEO, avaliar sua viabilidade, propor ajustes etc. Tem domínio sobre as contas mas não sobre a lógica da empresa.
Nos anos 80 e 90 tivemos casos de empresas colocadas sob as ordens do financeiro. Saiu cortando custos, desmontou departamento essenciais, em pouco tempo conseguiu colocar a empresa no azul. Para equilibrar rapidamente as contas, deixou a empresa com um nível de faturamento incompatível com os desafios de disputar mercado. E a empresa quebrou.
É mais ou menos o dilema entre colocar ou Joaquim Levy ou Nelson Barbosa na Fazenda. Segundo alguns jornais, Levy adiantou que quer carta branca. Se entregar a Joaquim Levy, ele será o regente indemissível e virá um novo choque pela frente.
Choque fiscal significará derrubar ainda mais uma demanda já precária. Efetuará os cortes para uma previsão xis de PIB. Os cortes ampliarão a queda do PIB e obrigarão a mais cortes - se o PIB, e não a meta de superávit for a variável de ajuste.
Significará ampliar de forma radical os cortes nos ministérios, interrompendo programas.relevantes - que já estão afetados pelo contingenciamento branco da atual Secretaria do Tesouro. Significará enfraquecer todos os demais Ministérios.
Levy é o homem de custos.
Não se espere dele definir o que é ou não é prioritário. Ele tem cabeça de contador - no melhor mas no mais restritivo sentido. Não tem a menor sensibilidade ou conhecimento para selecionar programas essenciais para o desenvolvimento (de ciência e tecnologia a programas sociais).
Sua estratégia única é a de mercado: basta aumentar o superávit e cortar investimentos públicos que o espaço será automaticamente ocupado pelo setor privado.
Poderá garantir a manutenção do grau de investimento a um preço caríssimo. E não trará para Dilma o apoio do mercado ou da economia. A economia desabará, as tensões sociais se ampliarão.
Tudo isso em um quadro em que a oposição busca o impeachment. Quando o tiroteio se ampliar, as passeatas em favor da Dilma terão apenas funcionários da Standard & Poors. Aliás, nem eles, porque se definidas metas de superávit radicais, não serão cumpridas.
Nelson Barbosa é defensor de um ajuste gradual. Nelson já antecipou sua estratégia, definindo tetos para os diversos tipos de gasto em um horizonte factível de médio prazo.
Ele não é homem de mercado, como Levy, mas é interlocutor que o mercado respeita.
As agências de risco não querem gestos heróicos. Com os erros monumentais cometidos na crise da Argentina de Cavallo, sabem que gestos heróicos têm desdobramentos trágicos. O que garante a confiabilidade das políticas fiscais são planos claros e politicamente viáveis, metas factíveis de médio prazo que, ano a ano, sejam cumpridas.
Levy seria o melhor solista para monitorar o plano, para avaliar a sua consistência. No Banco Central, poderá ser o grande transformador que faltava, para uma política consistente com a Fazenda, de mudar a estrutura de títulos públicos e fazer nova investida para a trazer a Selic para níveis civilizados.
Se colocá-lo como maestro, a orquestra toca e Dilma dança.

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