Eleições: construção, desconstrução, reconstrução



Flávio Aguiar

Diante da perda de ímpeto da candidatura de Marina Silva, passou-se a falar da
“desconstrução” de sua persona política. Segundo alguns arautos da mídia
conservadora essa “desconstrução”chegaria às raias da “perversão” por parte da
campanha da presidenta Dilma Rousseff. Cheguei a ler apelos indisfarçáveis,
embora disfarçados, para que o ainda naquela altura “outro” candidato, Aécio
Neves, não exagerasse nas suas críticas, para não ajudar a “desconstrução”
perversa de Marina empreendida pelo PT, inviabilizando o segundo turno.
Na verdade foi a própria candidatura de Marina, depois da morte de Eduardo
Campos, que encontrou dificuldades para se construir. Ela deu um passo em falso
muito complicado e grave ao recuar e se diminuir diante das ameaças do pastor
Malafaia. Depois vieram outros passos em falso. A insistência na tecla da falciosa
“independência do Banco Central” a tornou dependente da linha pessedebista:
grudou-a, praticamente, na sombra de Aecio Neves.
Chorar por causa de críticas também não a favoreceu: a população sabe que a
política dentro e fora do Brasil é uma selva – às vêzes uma jaula – cheia de tigres,
leões, hienas, sucuris e jibóias, sem falar nos ratos de plantão. Quem quer se
candidatar a entrar na jaula tem que se mostrar capaz de enfrentar as feras. A
atitude de Marina lembrou demais a de Romário chorando diante do Felipão em
2010 por não ter sido convocado. Aí mesmo é que ele próprio se cortou da seleção.
Diante das fraquezas da candidatura Marina, cada vez mais expostas à medida em
que ela se expunha, Aécio começou a reconstruir a sua. Pode ser que chegue ao
segundo lugar, mas ainda tem muito chão para correr, tirando votos da rival na
candidatura a vice. Precisaria tirar-lhe, puxando-os todos para si, pelo menos uns
quatro milhões de votos. Ou então captar quase todos os indecisos e capturar mais
alguns milhões de eleitores de Marina.
Na verdade, quem agüentou um longo e desgastante processo de “desconstrução”
foi a presidenta Dilma Rousseff. Este processo sempre atingiu o PT, desde sempre:
Tem razão Lula ao dizer que a mídia o crucificou (o termo é meu, não dele) durante
seus oito anos de presidência. Os ataques vinham de antes, inclusive.
Mas agora no caso da presidenta que disputa a reeleição, a coisa “recrudesceu”,
como diria o ex-presidente Figueiredo. Recrudesceu porque a hipótese de mais
quatro anos de PT no Planalto, com Dilma, exacerbou vários medos e ódios. Medo
do desossamento do PSDB, como aconteceu com o DEM. Nesta altura é quase certo
que o PSDB vai ficar sem Minas, reduzindo seu arraial consideravalmente. Medo de
perder a “boca” que representa o pré-sal, além de outras. E o ódio: as políticas
sociais do governo, ao darem certo, exacerbaram o ódio de classe, em todas as
frentes. A “desconstrução” de Dilma e do governo tornou-se mais raivosa e odienta
do que nunca, alimentada também por uma onda de indisfarçável, mesmo que
disfarçada, de machismo.
Não só se procurou desqualificar sistematicamente o governo e a presidenta como
corrupto ou conivente com a corrupção (“o mais corrupto da história”), como a partir
de 2014 a mídia conservadora, dentro e fora do Brasil, entrou por uma campanha
de “desconstrução” do próprio país e do povo brasileiro. O mote central desta
campanha foi a nossa propalada “incompetência” para organizar a Copa do Mundo,
uma verdadeira “inapetência” para o sucesso devido a sermos um país de
favelados, corruptos, narcotraficantes ou narcotraficados, desorganizados,
pobretões e vocacionados para a miséria eterna.
Não deu certo.
E com a campanha, enquanto Aecio se enrolava e Marina (depois de suceder a
Campos) se enrolava na medida mesma em que se desenrolava, a presidenta
Dilma passou a se reconstruir.
Sua reconstrução, até o momento, teve uma palavra-chave: futuro. O futuro é e
continua sendo a grande palavra-chave do Brasil. É o futuro do emprego contra o
futuro do desemprego, por exemplo. É a confiança versus a desconfiança no futuro.
E a presidenta conesguiu, até o momento, captar a confiança de um grande número
de brasileiros no futuro que ela oferece e simboliza.
Esperemos que isto se confirme de vez neste domingo, ou mesmo no segundo
turno, se ele acontecer.

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