Água: qual é o plano de contingência do Alckmin?


José Augusto Valente (*)
na Carta Maior

A cada dia que passa, aproxima-se o momento em que não haverá mais água para
cerca de oito milhões de pessoas, que são abastecidas pelo sistema Cantareira,
em São Paulo.
Esse sistema já consumiu praticamente todos os volumes mortos e, agora, tende
ao lodo.

A pergunta que não quer calar: qual é o plano de contingência do governador
Alckmin para garantir um mínimo de água para essas oito milhões de pessoas, até
que a situação se normalize?
Eu sei o que acontece quando uma família fica sem água, porque já passei por
essa experiência quando tive que cuidar de abastecimento de água, em nível
municipal. Uma família sem água é capaz de tudo. A água é a necessidade
fundamental do ser humano e, numa situação de carência total, ele pode matar ou
morrer para obtê-la. Muitas pessoas sem água são capazes de causar um clima
incontrolável de comoção social.
É sabido que os governos do PSDB têm ojeriza a planejamento e, recentemente,
escrevi artigo sobre isso. A história desse caos no abastecimento de água pode ser
contada pela rejeição dos governos Alckmin e Serra aos planos diretores
elaborados por técnicos do mais alto nível que anunciavam o risco da situação
enfrentada por parte dos paulistas e especificavam o que deveria ser feito para
evitar o caos.
O problema de abastecimento de água em São Paulo sempre foi verbalizado pelos
órgãos técnicos do governo. Mas nunca foi levado em conta pelos seguidos
governos tucanos.
Em Seminário de Recursos Hídricos realizado pelo BNDES em 2004, foi apresentado
trabalho intitulado “Plano Diretor de Abastecimento de Água da RMSP”, coordenado
pelo Prof. Dr. Kamel Zahed Filho que, além de professor da USP, é funcionário da
Sabesp. Diagnósticos e propostas que não evoluíram.
Outro trabalho de 2008, com o título “Impactos Ambientais do Rodoanel sobre os
mananciais”, também conduzido pelo Prof. Dr. Kamel Zahed Filho, diz o seguinte
sobre o sistema Cantareira:
“Ao mesmo tempo em que o uso do solo vem se modificando, a região enfrentou
nos últimos anos, principalmente no período de 1998 a 2003, uma intensa
estiagem, com diminuição dos índices pluviométricos e conseqüente queda dos
níveis dos reservatórios do Sistema Cantareira. Em novembro de 2003, o momento
mais crítico deste período, o Sistema Cantareira atingiu o alarmante nível de quase
1% de armazenamento e colocou em risco o abastecimento público de quase
metade da população da RMSP.”
Vejam só, há onze anos atrás o sistema Cantareira, que fornece água para metade
da população do Estado de São Paulo, chegou a 1% de armazenamento. Logo, a
situação atual não é nenhuma novidade! E as providências adotadas? Zero!
Esse trabalho de 2008 afirma que “A quantidade de água produzida para
abastecimento está muito próxima da disponibilidade hídrica dos mananciais
existentes. Essa pequena folga coloca a região em uma situação frágil, onde um
período de estiagem mais prolongado pode resultar em racionamento de água para
grande parte da população. E, em pouco tempo, a região precisará de mais água.”
Diz mais, “O Rodoanel causará impacto em vários mananciais da RMSP. Como
exemplo temos o trecho Norte que cortará a Serra da Cantareira e ficará muito
próximo da represa Paiva Castro… apresentando riscos a estes mananciais. Além
disso, a simples presença do Rodoanel provocará um intenso movimento imobiliário
nas suas proximidades, o que já foi observado com o trecho Oeste. Este
movimento causará um forte impacto social, além de reduzir as áreas permeáveis e
aumentar o consumo e a poluição.”
Assim, fica a suspeita de que os problemas atuais do Sistema Cantareira poderiam
ter sido resolvidos ou mitigados há mais de dez anos. Entretanto, os governos
Alckmin-Serra-Alckmin não tomaram medidas suficientes para proteger os
mananciais e para conter os inúmeros vazamentos na rede de tubulações do
sistema. Finalmente, não desenvolveu campanhas educativas, acompanhadas a
medidas de estímulo ao racionamento de água.
Dessa forma, não seria um exagero apontar os governos tucanos como
responsáveis por esse megaproblema, que atingiu uma situação muito grave para o
sistema de abastecimento de água de SP, e que poderá chegar ao colapso total
meados de novembro deste ano.
Normalmente, quem planeja faz análise de surpresas e prepara planos de
contingência, para prevenir ou reparar os danos causados. O governo Alckmin não
planejou e não desenvolveu medidas preventivas necessárias para enfrentar o
problema.
Mas será que conforme o problema foi aumentando, indicando que o abastecimento
poderia chegar a zero, ele preparou plano de contingência para
evitar que haja uma comoção sucedida por explosão social quando isso acontecer?
Até agora, por pressão da Agência Nacional de Águas – ANA, a Sabesp somente
apresentou planos de contingência para receber permissão da agência para uso dos
volumes mortos.
Mas, qual é o plano para quando só restar o lodo?

(*) José Augusto Valente – especialista em infraestrutura

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