O negócio de Israel “vidas em troca de terra” é roubo. Puro e simples
4/9/2014, [*] Robert Fisk, The Independent, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
POSTADO POR CASTOR FILHO
Entreouvido na tendinha do Pirumole:
“Então Israel não é um país... É uma enorme quadrilha!”
Quanto Israel roubou de terras da Palestina (clique na imagem para aumentar) |
Visão de mundo? Israel rouba terras, os palestinos são roubados. Não há outra coisa para ver.
E assim mais uma fatia da terra palestina escorregou pelo ralo. Mais uns mil acres de terra palestina roubada pelo governo de Israel – porque... “apropriação” é roubo, não é? – e o mundo já apareceu com as desculpas de sempre.
Os norte-americanos acharam o roubo “contraproducente” para a paz, o que é reação bastante amena, se se considera o que os EUA diriam/fariam se o México roubasse 1.000 acres de terra do Texas e resolvesse construir casas ali para imigrantes mexicanos ilegais nos EUA.
Mas, não. Foi na “Palestina” (país inexistente, daí as aspas). E Israel conseguiu safar-se, terras roubadas e tudo, embora o roubo alcance agora escala inusitada – foi a maior quantidade de roubo de terra em 30 anos, desde que foi assinado oAcordo de Oslo em 1993.
O aperto de mão Rabin-Arafat, as promessas e trocas de territórios e retiradas militares, e a determinação de deixar tudo de importante (Jerusalém, refugiados, o direito de retorno) para o fim, até que todos confiassem tanto uns nos outros que a coisa seria facílima... não surpreende que o mundo tenha feito descer sobre os dois sua generosidade financeira.
O aperto-de-mão entre Rabin e Arafat |
Mas esse mais recente roubo de terra não apenas reduz a “Palestina”: também mantém o círculo de concreto armado em torno de Jerusalém, para manter os palestinos bem distantes, tanto da capital que se espera que eles partilhem com israelenses, como de Belém.
Foi instrutivo saber que o conselho Etzion israelense-judeu considerou o roubo como castigo pelo assassinato de três adolescentes israelenses em junho.
O objetivo dos assassinatos dos três jovens foi semear o medo entre nós, interromper nossa vida diária e pôr em dúvida nosso direito [sic] à terra – anunciou o conselho Etzion. Nossa resposta é reforçar a colônia.
Deve ser a primeira vez que alguém “adquiriu” terras na “Palestina” sem usar desculpas sobre segurança ou direitos de nascimento – ou por decisão-autorização direta de Deus. Dessa vez, o motivo para roubar terra palestina foi declaradamente vingança. Assim se cria interessante precedente.
Se a vida de um israelense inocente – cruelmente ceifada – vale cerca de 330 acres de terra, a vida de um palestino inocente – também cruelmente ceifada – vale a mesma porção de terra.
E se metade, que seja, dos 2.200 palestinos mortos em Gaza mês passado – e esse é número conservador – fossem inocentes, nesse caso os palestinos hoje teriam direito assegurado a 330 mil acres de terra israelense; na realidade, muito mais. Mas por mais “contraproducente” que essa conta seja, com certeza os EUA não aprovariam. Israel rouba terra, palestinos perdem terra; é assim que funciona. É assim desde 1948, e assim continuará.
Mahmoud Abbas/2011 por Latuff |
Jamais existirá ‘'Palestina'’ alguma, e o mais recente roubo de terra palestina é apenas mais um ponto acrescentado no livro dos padecimentos que os palestinos têm de ler, enquanto seus sonhos de terem estado seu se vão diluindo. Nabil Abu Rudeineh, porta-voz do “presidente” palestino Mahmoud Abbas, disse que o chefe dele e as forças moderadas na Palestina haviam sido “apunhalados pelas costas” pela decisão dos israelenses, o que é dizer pouco, praticamente nada. Abbas tem as costas completamente apunhaladas, de cima a baixo. E esperava o quê, da vida, quando escreveu um livro sobre as relações palestinos-israelenses no qual não escreveu nem uma única vez, uma, que fosse, a palavra “ocupação”?
O que significa que voltamos ao velho joguinho. Abbas não pode negociar com ninguém a menos que fale pelo Hamás, tanto quanto pela Autoridade Palestina. Como Israel sabe. Como os EUA sabem. Como a União Europeia sabe. Mas cada vez que Abbas tenta construir governo de unidade nacional, todos nós nos pomos a guinchar que o Hamás é organização “terrorista”.
E Israel argumenta que não pode conversar com uma organização “terrorista” que exige a destruição de Israel – por mais que Israel costumasse conversar muito com Arafat e, naqueles dias, tenha ajudado o Hamás a construir mais mesquitas em Gaza e na Cisjordânia, para servirem como contrapeso ao Fatah e a todos os outros então “terroristas” lá de Beirute.
Mahmoud Abbas/2014 por Latuff |
Claro, se Abbas fala só por ele mesmo, Israel então diz o que já disse: que se Abbas não fala por Gaza, Israel não tem com quem negociar. Mas... isso realmente ainda interessa? Todas as manchetes do mundo, sobre esse assunto, deveriam exibir uma tarja de luto: “Adeus, Palestina”.
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[*] Robert Fisk é filho de um ex-soldado britânico da Primeira Guerra Mundial. Estudou jornalismo na Inglaterra e Irlanda. Trabalhou como correspondente internacional na Irlanda - cobrindo os acontecimentos no Ulster - e Portugal. Em 1976, foi convidado por seu editor no The Times onde trabalhou até 1988 substituindo o correspondente do jornal no Oriente Médio. Mudou para o The Independent em 1989- após uma discussão com seus editores sobre modificações feitas em seus artigos, sem seu consentimento.
Cobriu a guerra civil do Líbano, iniciada em 1975; a invasão soviética do Afeganistão, em 1979; a guerra Irã-Iraque (1980-1988), a invasão israelense do Líbano, em 1982; a guerra civil na Argélia, as guerras dos Balcãs e a Primeira (1990-1991) e a Segunda Guerra do Golfo Pérsico, iniciada em 2003. Fisk notabiliza-se também pela cobertura ao conflito israelo-palestino. Ele é um defensor da causa palestina e do diálogo entre os países árabes, o Irã e Israel.
Considerado como um dos maiores especialistas nos conflitos do Oriente Médio, Fisk contribuiu para divulgar internacionalmente os massacres na guerra civil argelina e nos campos de refugiados de Sabra e Chatila, no Líbano; os assassinatos promovidos por Saddam Hussein, as represálias israelenses durante a Intifada palestina e as atividades ilegais do governo dos Estados Unidos no Afeganistão e no Iraque. Fisk também entrevistou Osama bin Laden, líder da rede terrorista Al-Qaeda em 1993, no Sudão, em 1996 e em 1997, no Afeganistão.
Robert Fisk é o correspondente estrangeiro mais premiado do planeta. Recebeu o Prêmio Correspondente Internacional Britânico do Ano sete vezes (as últimas em 1995 e 1996). Também ganhou o Prêmio Imprensa da Anistia Internacional no Reino Unido em 1998 e 2000.
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