Cabeça inchada pensa mal, muito mal

 Autor: Fernando Brito
vaievem
Tenho lido muita besteira sobre as consequências do massacre sofrido ontem pelo time brasileiro.
Já li que ele vai decidir a eleição, a inflação, a depredação e o escambau, como dizia o Stanislau Ponte Preta.
E aí fui buscar outras “catástrofes” do futebol, que só para quem já dobrou o Cabo da Boa Esperança, como eu, são “recentes”, mesmo com mais de 30 e 40 anos.
Em 1972, um Botafogo que já não era , como três ou quatro anos antes, o grupo de craques que fora, com o Santos, a base da Seleção de 1970 – acho que só Jairzinho remanescia – aplicou inimagináveis 6 a 0 num Flamengo que não era fraco, não. Tinha Liminha, Rodrigues Neto (ótimo lateral esquerdo), o lendário Fio Maravilha, Zanata e o ex-botafoguense Paulo César Caju.

Quem dirigia o Flamengo era nada menos que Zagallo, com um tricampeonato mundial de 70 fresquinho em seu currículo.
Humilhação no dia do aniversário rubro-negro.
Durante nove anos a torcida flamenguista – eu, garoto, lembro perfeitamente das gozações – teve de aguentar o infamante “6 a 0, 6 a zero” dos botafoguenses, ao ponto do flamenguista Henfil ter eternizado o nome de “cri-cri” como símbolo dos torcedores do Botafogo, para ele uns chatos.
Ate que em 1981, uma já madura geração de craques – Júnior, Adílio, Andrade, Zico ( que era reserva em 1972) e Nunes devolveu  o implacável placar no Maracanã, como requinte de “maldade” de ter em campo o já veterano Jairzinho, goleador do jogo de 72, com direito até a um gol de letra, então.
O que era trauma virou, apenas, história.
O desastre de ontem é (quase) apenas o que é, uma tragédia esportiva.
Claro que tudo é muito mais grave com uma seleção nacional e ainda muito mais com uma Copa em nosso país.
Embora, quando se trate de amor ao Flamengo – para quem conhece os flamenguistas – a coisa é bem perto do “nacional”.
Se o Brasil fosse um clube de futebol, sim, seria possível e lógico que determinasse a queda de seu presidente, como, creio, provocará mudanças – nem tantas, mas finalmente! – na CBF. E, talvez (tomara) o fim do entendimento de que o futebol pode ser – e nunca foi, desde que o profissionalismo tornou-se sua razão de ser – jogado por um grupo de amigos, uma família como se louvou em Scolari.
Alemanha e Holanda estão aí para provar o contrário.
Ou será que os nervos dos alemães, perdendo de 2 a 1 para Gana, de virada, na metade do segundo tempo, ou dos holandeses, sendo derrotados por 1 a 0 pelos mexicanos até pouco mais de cinco minutos antes do final do jogo não sofreram como os nossos depois daquele 1 a zero inesperado de ontem?
Se alguém quiser ver alguma semelhança entre política e futebol, não a procure em campo, mas fora dele.
Sem um líder em campo, o que havia fora dele – Felipão – visivelmente desertou de sua mínima obrigação de, seguindo a singela máxima do lendário Neném Prancha, “arrecuá os arfe pra evitar a catastre” e assistiu impassível a destruição de nosso time.
O resto é simples exploração oportunista de quem acha que o povo brasileiro é formado por um bando de idiotas, sem raciocínio e incapaz de perceber, em meio à frustração, que o que não funcionou visivelmente foi o mais importante para nossas emoções – o jogo de futebol – e nada teve a ver com nossa capacidade de organizarmos uma competição mundial de forma exemplar e que, até ontem, era unanimemente considerada um sucesso.
Estamos, todos, de “cabeça inchada”.
E quem pensa de cabeça inchada pensa mal, muito mal.

Comentários