OS BONS MOÇOS DA CAMPANHA


Paulo Moreira Leite
Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".

















Numa eleição disputadíssima, bom mocismo de petistas costuma dar conforto a adversários


O aspecto mais curioso da campanha presidencial de 2014 é o surgimento de  bons moços dentro do PT.

Não faltam exemplos. Os bons moços lamentam  que o governo  não tenha dado respostas aos protestos de junho – esquecendo que Dilma Rousseff foi a única política brasileira que pelo menos tentou, entre milhares do Congresso, nos governos estaduais, nas prefeituras, na oposição e na situação, em mais de 30 partidos, a apresentar um conjunto de projetos que respondiam a questões colocadas pelas ruas, a  começar pela  reforma política. As propostas tinham vários defeitos, todos sanáveis. Foram destroçados sem piedade pelos adversários em função de suas qualidades.


O bom moço não cobra a responsabilidade de quem enterrou mudanças que todos diziam querer. Faz auto-crítica pelas falhas de seus aliados.

O bom moço é assim. Se aparece um erro no lado adversário, corre para descobrir uma falha equivalante entre aliados.

Quando apanha numa face, mostra a outra.

Quer ser o melhor da classe, ainda que todos saibam que não é o queridinho da professora e sempre será colocado de castigo por razões injustas.

Imagine um bom moço do PSDB. Começaria dizendo que o governo Fernando Henrique entregou uma inflação de 12% ao ano -- e que esse patamar nunca foi alcançado depois da posse de Lula. Também diria que a falta de reservas daquele tempo colocou o país de volta ao FMI. Falaria também da compra de votos para a emenda da reeleição.

Este é o jogo real.

Tenho certeza de que não sou o único brasileiro que tem estranhado o comportamento recente do ministro Gilberto Carvalho, uma liderança histórica do PT, com um papel imenso nas conquistas do governo Lula-Dilma.


Hoje me atrevo a questionar suas declarações recentes.

E me atrevo  a dizer que sinto aí um espírito de bom mocismo.

Dias depois do VTNC do Itaquerão, Gilberto Caravalho considerou que era necessário colocar em seu devido lugar  a reação do partido – e de amplos setores democráticos sem relação com o PT e até seus adversários -- em defesa da presidente.

“No metrô vi muito moleque que nada tinha a ver com a elite branca gritando palavrão.”

 No inicio desta semana, quando faltam 72 horas para o Supremo rever medidas absurdas contra dirigentes  condenados da AP 470, que se dizem inocentes da maioria das denúncias apresentadas no julgamento, que também são rejeitadas por grandes mestres do Direito, Gilberto Carvalho faz questão de dizer a Natuza Nery, da Folha:

“Não nego atos de corrupção que tivemos. Infelizmente, eles aconteceram, têm de ser reprovados.”

Falando sobre a campanha eleitoral o ministro afirma é que necessário fazer uma “grande mobilização que não parta da ilusão de que o povo pensa que está tudo bem.”

É bom sublinhar alguns pontos.  O repúdio ao VTNC era necessário porque o xingatório, naquelas circunstancias, nada tinha a ver com eventual descontentamento da população. Era uma atitude de desrespeito a democracia que pretendeu, pela violencia verbal, intimidar e silenciar seus adversários. Nada a ver com palavrões no metrô.  Quem esteve nos encontros recentes do PT sabe que o partido está longe de acreditar que o "povo pensa que está tudo bem." Dizer o contrário ajuda quem gosta de dizer que a campanha tem uma postura arrogante.

Os votos de outubro irão idefinir se conquistas históricas dos últimos 12 anos serão renovadas a partir de 2015, se possibilidades novas de progresso podem ser mantidas. Ou se haverá um retrocesso, de duração imprevisível.


Num confronto dessa natureza, cada frase, cada palavra, cada vírcula e cada ponto de exclamação se traduz pelo valor político. E quem traduz são meios de comunicaçao em sua maioria engajados – como Gilberto Caravalho admite – em auxiliar os adversários de Dilma, de Lula e do PT.

O horizonte  das palavras e dos silêncios é o mesmo – a disputa pelo poder. Falhas e erros devem ser admitidos com franqueza. O debate, interno e público, é necessário.


Mas cabe levar em conta um elemento básico das campanhas eleitorais: cada passo em falso prejudica aliados e dá conforto ao inimigo.

Essa é a questão do bom mocismo.

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