"Nem sob a ditadura militar"
Truculência de Joaquim Barbosa constrange o país. Mas foi apenas mais uma cena.
Só uma preocupação absoluta com o marketing pessoal pode explicar a cena truculenta ocorrida ontem a tarde, no Supremo Tribunal Federal. Numa reação que evitou uma nova derrota no momento em que está deixando o STF na condição de estátua, o presidente Joaquim Barbosa livrou-se – ao menos temporariamente – de uma situação contrangedora: ser obrigado, pelo plenário, a debater o pedido de prisão domiciliar de José Genoíno, direito elementar reconhecido até pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, e que vários ministros, favoráveis a solicitação, gostariam de discutir e resolver de uma vez por todas.
Num “desassombro” que a situação justificava inteiramente, conforme esclarecimento prestado pelo ministro Marco Aurélio Mello mais tarde, o advogado Luiz Fernando Pacheco, responsável pela defesa de José Genoino, foi a tribuna pedir – ou “rogar,” conforme suas palavras -- que Joaquim Barbosa colocasse o assunto na pauta do Supremo. O argumento era vergonhosamente básico.
Pacheco lembrou que os direitos de um cidadão aprisionado têm prioridade sobre outros assuntos em debate – naquele momento, o STF discutia mudanças na composição das bancadas de deputados federais. Nem vamos lembrar que Genoíno é cardiopata e que seu retorno a Papuda jamais recebeu o respaldo unânime dos médicos que o examinaram. A maioria sempre fez ressalvas e estabeleceu condicionantes – na postura típica de quem não quer se comprometer inteiramente com uma decisão que, sabidamente, contém riscos. Vamos falar de truculência.
Joaquim mandou desligar o microfone de Pacheco e, em seguida, convocou dois seguranças para levá-lo, a força, para fora a do STF. Em vez de argumentar e ponderar, com um advogado, com seus colegas, mais tarde, deu uma ordem aos subalternos, a polícia que faz segurança ao Supremo. Algo ver com Direito? Com Justiça?
"Nem nos anos de chumbo, os advogados que militaram nos tribunais militares foram submetidos a um espetáculo degradante e humilhante como esse," reagiu Técio Lins e Silva, presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, resumindo a reação de outras entidades ligadas ao Direito. Marcus Vinícius, presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil reagiu no mesmo tom. Lembrou que o advogado é “inviolável” no exercídio de sua atividade professional e que “sequer a ditadura militar” agiu de maneira semelhante.
Entre os demais ministros do STF, coube a Marco Aurélio Mello demonstrar a irracionalidade da situação: “Nada surge sem uma causa,” disse o ministro. A causa, claro, é a recusa de Joaquim de discutir a prisão domiciliar de Genoino. Imagine o vexame. Depois de convocar inúmeras juntas médicas, até obter um atestado que fosse de seu agrado, Joaquim corre o risco de ser desautorizado pelo próprio tribunal.
Será que faria um novo “alerta à nação” , repetindo o espetáculo proporcionado quando perdeu os embargos sobre o crime de quadrilha?
Mimado pelos meios de comunicação depois que ficou claro que a AP 470 iria produzir, na Justiça, um massacre de Lula e do PT que a oposição não era capaz de obter nas urnas, sua principal bussola de atuação nunca foi a isenção nem o distanciamento que se espera de um magistrado, mas a parcialidade e a agressividade que empolgava as platéias da TV Justiça e os cumprimentos que recebia em aparições públicas.
A cena de ontem foi gravíssima.
Mas, no fundo, foi mais uma.
Sua utilidade, de qualquer modo, é didática. Explicita, pela violência, o método empregado para condenar os réus da AP 470. Não se assistiu ao espetáculo da Justiça. Mas à Justiça do espetáculo.
Depois de manter provas escondidas num inquérito 2474, que poderia ser util para a defesa dos condenados. Recusar o desmembramento, que era tão óbvio que já virou jurisprudências para os tucanos e para os políticos do DEM apanhados na mesma situação.
Agora se impede um advogado de colocar uma questão de ordem. “Nem nos anos de chumbo...Nem na ditadura militar...”
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