E José Eduardo Cardozo convalidou o terrorismo do Estadão



Chama-se de "suite" a repercussão que o  jornal dá a uma reportagem própria, visando manter o assunto no ar.
No domingo, o Estadão produziu uma manchete terrorista, dentro da campanha para desmoralizar a Copa. Sem evidências maiores na reportagem, a manchete mencionava acordo entre os Black Blocs e o PCC para aprontar na Copa.
Uma leitura superficial da reportagem mostraria tratar-se apenas de bazófia de um suposto integrante dos Black Blocs, sobre supostos contatos entre membros da seita que foram presos e integrantes do PCC e uma suposta conversa onde teria havido uma suposta intenção de apoio do membro do PCC (que não pertence à cúpula) às manifestações. Era o mesmo que entrevistar um cabo da PM e ele anunciasse em off, da sua cabeça, a estratégia da cúpula.

Qualquer analista medianamente informado sobre o PCC sabe que ele coíbe até pequenos crimes em periferia, para não chamar a atenção da polícia, atrapalhando seus negócios.
Aí o jornal vai atrás de fontes para repercutir a matéria. Não consegue nenhuma fonte. Esperto, o Secretário de Segurança de São Paulo Fernando Grella nem se manifestou, se é que foi procurado. Ou seja, a maior autoridade sobre o PCC de São Paulo não ousou soltar nem uma mísera nota oficial sobre a manchete, porque não é trouxa.
Sem conseguir outras fontes, a manchete tenderia a morrer no nascedouro, quando aparece a boia salvadora: o próprio alvo final da manchete, o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo. E José Eduardo Cardozo dá uma brilhante entrevista, onde expõe princípios de direito e conceitos de Justiça dignos dos mais altos pensadores, dos mais profundos juristas.
Disse ele:
* É inadmissível a associação de esforços entre os Black Blocs e a facção criminosa Primeiro Comando da Capital para transformar a Copa do Mundo em um caos. Não se sabe se a expressão "associação de esforços" foi dele ou do repórter. Em todo caso, definição brilhante.
É inadmissível a união pelo crime. Eu pensava que associação criminosa fosse apenas crime.  Mas o Ministro da Justiça afirmar em alto e bom som que crimes são inadmissíveis dá outro molho retórico ao tema.
Não toleraremos abusos de qualquer natureza. Pela atuação do Ministério, aparentemente só serão coibidos os "abusos de qualquer natureza".
E as pessoas que praticarem ilícitos responderão nos termos da lei penal. Fantástico! Vindo de um Ministro da Justiça, um especialista em direito constitucional, é uma declaração inédita.
Um fecho glorioso: começando pela conspiração do mal e terminando com o próprio Ministro da Justiça assumindo a responsabilidade pelo que vier a ocorrer.
Ora, se o Ministro Cardozo considerasse a denúncia fundamentada, em vez de dar entrevistas estaria juntando os grupos de monitoramento da Copa, levantando informações, consultando o Secretário de Segurança de São Paulo e até determinando a prisão preventiva dos supostos planejadores do caos. Se não considerasse fundamentada, seu papel seria esvaziar o terrorismo midiático.
Em vez disso, prefere convalidar a ameaça com declarações óbvias e nenhum anúncio de medida. Tem sido assim permanentemente, a ponto de ser taxado pelo Ricardo Boechat de "o rei do gogó".
O desastre indígena
É o mesmo estilo que vigorou na reunião com as lideranças indígenas.
Antropólogos, funcionários do Judiciário, Ministério Público e órgãos federais que algum dia negociaram com índios, sabem que o tratamento  exige certo cerimonial, distante dos procedimentos formais dos dito civilizados.
Assim como não se toleram moças de minissaia em audiências com autoridades do judiciário, assim como Cardozo não aceitaria uma audiência com um sujeito bêbado de barriga para fora, a cultura indígena não aceita as reuniões secas, sem uma interação com o outro lado.
Dedicam a parte inicial a conversar, a se aproximar, a ganhar confiança no interlocutor. Só depois vão se abrindo e definindo acordos, sem necessidade de papel assinado.
É chato, dá trabalho. Mas se o Ministro da Justiça, autoridade máxima a tratar dos conflitos indígenas, não respeita os protocolos culturais, quem respeitará?
Depois de ter faltado ao encontro já agendado no Rio Grande do Sul, da Polícia Federal ter aproveitado o encontro para prender lideranças indígenas, provocando protestos até dos agricultores envolvidos no conflito,  Cardozo marca um novo encontro em Brasília. Chega duas horas atrasado - embora com justa causa, dado o ingente esforço feito na noite anterior no restaurante Piantella, tratando dos altos interesses da República.
Conversa rapidamente e sai para os abraços: anuncia para os jornalistas presentes que o MInistério será o espaço da mediação para os conflitos indígenas. É o rei do gogó!
Os índios saem pela outra porta, anunciando guerra total ao Ministro.

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