Que se cumpra a lei: deixem Dirceu trabalhar

Ministros do STF
 O processo do chamado “mensalão” já foi, conforme alertou o ex-presidente Lula, uma ato mais político do que jurídico. Contrariando regras básicas do Direito Penal que datam do século 19, os réus já entraram no processo condenados. Uma parte dos ministros do STF acabou por selecionar argumentos jurídicos de forma pré-determinada, em uma ginástica conceitual que mal escondeu propósitos completamente políticos. Para exemplificar esta triste realidade, nada melhor do que a afirmação de uma das integrantes da Suprema Corte que apesar de reconhecer não ter provas contra José Dirceu, disse que o condenaria porque a literatura jurídica o permitia.


Entretanto, mais tarde, para alívio dos que prezam pelo Estado democrático de direito, a mesma corte decidiu pela revisão de uma parte das decisões, absolvendo alguns dos condenados da pena de formação de quadrilha, o que possibilitava a adoção do regime semiaberto para José Dirceu.

Esta foi uma boa demonstração de que se pode ter esperanças de que as injustiças do julgamento do “mensalão” sejam apenas um triste episódio, um ponto fora da curva na história do tribunal, conforme asseverou o grande jurista Celso Antônio Bandeira de Mello.

Entretanto, diante da justa decisão de seus pares, o presidente do STF Joaquim Barbosa deixou à mostra o caráter político do julgamento que havia sido realizado antes. Em um acesso de passionalidade impróprio para a posição que ocupa, o ministro acusou os colegas de serem uma “maioria de circunstância” e atacou a decisão como algo “à margem da lei”. Disse que seus pares, dentre eles o decano Celso Mello que havia apoiado a condenação dos réus anteriormente, usavam “argumentos pífios”. Avisou, em tom de ameaça, que estava realizando com suas denúncias um “alerta à nação”.

Assim, a decisão de revisão da pena de formação de quadrilha, que carregava em si a possibilidade de minorar um pouco as injustiças do julgamento da AP 470, não teve consequência. José Dirceu, apesar de ter garantido pela lei o direito ao regime semiaberto, permanece trancafiado no presídio da Papuda há quase seis meses, sem exercer o seu direito de trabalhar.

Ao não cumprir a decisão tomada pela maioria do tribunal, dá-se a impressão de que as decisões do STF só são sagradas em alguns casos. Isto é péssimo para a democracia brasileira e para a autoridade do tribunal.

Diga-se, inclusive, que Dirceu nunca teve uma sentença transitada em julgado que lhe cassasse este direito: seus advogados vêm lutando para que ele possa exercer esta prerrogativa desde sua prisão. Assim, a violação de que José Dirceu é vítima vem de antes da decisão tomada pelo STF sobre o crime de formação de quadrilha.

A manutenção de José Dirceu na prisão da Papuda em regime fechado é uma ofensa grave ao Estado de direito no Brasil. Não se trata de um problema do PT ou da esquerda, mas de um importante passo atrás em conquistas democráticas que são patrimônio de todos os brasileiros. Acovardar-se diante da pressão da grande mídia, que busca mobilizar a opinião pública para um verdadeiro justiçamento de Dirceu é um erro grave, que cedo ou tarde cobrará o seu preço.

Comentários