Pulitzer: Um tapa na cara do Estado de vigilância
A Universidade
de Columbia concedeu a honraria mais prestigiada do jornalismo, a
medalha de ouro do Prêmio Pulitzer, aos jornais que publicaram artigos
baseados em documentos vazados pelo ex-contratado pela Agência de
Segurança Nacional dos EUA, Edward Snowden.
Por Patrick Martin, no World Socialist*
Reprodução
O comitê
de seleção do Prêmio Pulitzer deste ano reconheceu o trabalho pelas
reportagens derivadas dos documentos fornecidos por Edward Snowden,
ex-técnico das agências de inteligência dos EUA, sobre o programa global
de espionagem.
O Washington Post foi escolhido por artigos escritos por Barton Gellman e pela
cineasta Laura Poitras, enquanto o britânico The Guardian, por textos de Glenn Greenwald, Ewan MacAskill e Pitras. Os quatro jornalistas fizeram amplo uso do material vazado por Snowden. Grenwald, Poitras e MacAskill encontraram-se com ele em Hong Kong em 2013, para iniciar o processo que expôs a espionagem ilegal e inconstitucional praticada pala Agência Nacional de Segurança (NSA) norte-americana.
A decisão da Universidade de Columbia é um tapa na cara do governo de Obama e dos aparatos de inteligência dos EUA e do Reino Unido. O governo norte-americano esta tentando extraditar Snowden para julgamento, prisão e possível execução como traidor. Tanto Washington quanto Londres ameaçaram e procuraram intimidar os jornalistas honrados pelos prêmios.
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A medalha é oferecida “por um exemplo incomum de serviço público meritório, prestado por um jornal ou site de notícias.” Ao Washington Post, “por sua revelação de vigilância secreta generalizada pela Agência Nacional de Segurança, marcada por relatos competentes e perspicazes que ajudaram o público a entender como as revelações se encaixam no quadro geral da segurança nacional”; ao Guardian, “por sua revelação da espionagem secreta promovida pela NSA, que ajudou, através de reportagens ativas, a acender o debate sobre a relação entre o governo e o público, sobre questões de segurança e privacidade”.
Uma medalha de ouro semelhante foi oferecida ao New York Times em 1972, por ter publicado os Documentos do Pentágono (Pentagon Papers), vazados por outro denunciante vindo de dentro do aparato de segurança nacional, o antigo oficial Daniel Ellsberg.
Edward Snowden emitiu uma declaração na segunda-feira, através da Fundação Liberdade da Imprensa [Freedom of the Press Foundation], parabenizando os dois jornais e chamando o prêmio de uma “defesa a todos os que acreditam que o público tem um papel no governo”. Ele prosseguiu: “Devemos isso aos esforços dos repórteres corajosos e seus colegas, que continuaram trabalhando diante de uma intimidação extraordinária, incluindo a destruição forçada de materiais jornalísticos, o uso inapropriado de leis de terrorismo, e tantas outras maneiras de pressão para tentar fazê-los interromper o que o mundo agora reconhece como um trabalho de importância pública vital. Essa decisão nos faz lembrar de que uma imprensa livre pode conseguir mudar o que uma consciência individual não pode. Meus esforços seriam inexpressivos sem a dedicação, paixão e habilidade destes jornais. Eles têm minha gratidão e respeito pelo serviço extraordinário a nossa sociedade. Seu trabalho nos permite pensar num futuro melhor e numa democracia mais responsável.”
Os mesmos quatro jornalistas receberam o prêmio George Polk por reportagens sobre segurança nacional, recebido na última sexta-feira, num hotel em Manhattan, Nova York. Greenwald e Poitras, ambos cidadãos norte-americanos, retornaram aos Estados Unidos para receber o prêmio, sua primeira visita ao país desde que redigiram, em conjunto, os relados sobre a espionagem e vigilância do NSA. Greenwald agora mora no Brasil, e Poitras em Berlim, para evitar a interferência norte-americana em seu trabalho jornalístico.
Ambos disseram que não foram impedidos de entrar no país. Ao se pronunciarem na cerimônia do prêmio Polk, homenagearam Snowden. “Este prêmio é, na verdade, para Edward Snowden”, disse Poitras. Greenwald acrescentou: “o que ele fez, assumindo sua responsabilidade, merece graditão — não indiciamentos e décadas de prisão”.
Em seu discurso de aceitação no Polk, MacAskil apontou que o Guardian enfrentou um ataque muito mais duro do governo no Reino Unido do que a edição norte-americana do Guardian, ou o Washington Post, já enfrentaram nos Estados Unidos. Em certo ponto, os agentes da inteligência britânica visitaram a redação do Guardian, para supervisionar a destruição de drives de computador, em um esforço pesado de intimidação.
Greenwald ainda não fez um comentário público sobre o prêmio Pulitzer, mas Poitras disse: “Eu acho que são ótimas notícias. É um testamento à coragem de Snowden, uma reivindicação por sua coragem e seu desejo de fazer o público saber o que o governo está fazendo”.
Poitras e Snowden também receberam o prêmio Ridenhour, que homenageia um veterano do Vietnã que trabalhou com Seymour Hersh para expôr o massacre de My Lai. Editores dos dois jornais fizeram declarações cumprimentando tanto os jornalistas quanto Edward Snowden. Alan Rusbridger, o editor-chefe do Guardian, disse: “Estamos particularmente agradecidos por nossos colegas pelo mundo que apoiaram o Guardian em circunstâncias que ameaçaram sufocar nossas reportagens. E compartilhamos essa honra não apenas com os colegas do Washington Post, mas também com Edward Snowden, que arriscou muito em nome do bem público e hoje está sendo reconhecido por este prestigioso prêmio.”
Janine Gibson, editora do Guardian norte-americano, disse que ganhar o prêmio foi importante. Referindo-se à escolha da Universidade de Columbia, ela foi além: “Acredito que essas palavras dizem alguma coisa sobre o que Edward Snowden fez, e o que os repórteres e editores fizeram, face a muita retórica e oposição.”
O editor executivo do Washington Post, Martin Baron, afirmou que a reportagem expôs uma política nacional “com profundas implicações para os direitos constitucionais dos cidadãos norte-americanos” e os direitos individuais ao redor do mundo. “Divulgar a expansão maciça da rede de vigilância da NSA foi um serviço público”, disse. “Ao construir um sistema de espionagem com foco e capacidade de intromissão espantosos, nosso governo também solapou abruptamente a privacidade individual. Tudo isso foi feito em segredo, sem debate público, e com fiscalização relaxada.”
Ele disse também que sem as revelações de Snowden, “nós nunca teríamos sabido o quão longe este país se afastou dos direitos individuais em favor do poder de Estado.
(Tradução: Gabriela Leite, no Outras Palavras)
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