A voz das vítimas
Como foi a vida no exílio daqueles que foram beneficiados, em 1979, com a Lei da Anistia, e o que eles pensam sobre a revisão da norma
Josie Jeronimo (josie@istoe.com.br)
O Congresso
viveu dias intensos no mês de agosto de 1979. Parlamentares do MDB
tentavam reagir aos termos do projeto do governo que estabelecia anistia
a crimes políticos cometidos durante o regime militar. A lei precisava
de aperfeiçoamentos, mas a oposição chegou à conclusão de que o mais
importante seria aprovar uma “anistia possível” para acabar logo com a
agonia de mais de quatro mil brasileiros que tiveram a vida interrompida
por uma década, fugindo da perseguição do regime. “Capenga”, como
resumiram deputados do MDB, a Lei da Anistia preservava os algozes de
cidadãos torturados e de famílias que tiveram a vida destruída pela
repressão. Mesmo assim, foi amplamente comemorada por aqueles que
passaram longos anos buscando refúgio em países desconhecidos, usando
documentos falsos e controlando crises de pânico a cada vez que eram
abordados por policiais estrangeiros.
O ex-ministro Franklin Martins narra essa
sensação de insegurança que tomava conta dos exilados. Ele conta que em
1976 elaborou detalhado plano de cruzar três continentes para chegar o
mais próximo do Brasil e se encontrar com companheiros de militância. A
lei de 1979 resgatou vidas espalhadas pelo mundo, mas, para Franklin,
passado o momento da “anistia possível”, o Brasil precisa avançar. “Não é
possível achar que a Anistia representou um acordo da nação, porque uma
das partes não podia negociar, estava silenciada na prisão, no exílio.”
No fim da década de 1960, Franklin e
Vladimir Palmeira eram as duas principais lideranças estudantis do País.
Mas Palmeira tem visão diferente da de Franklin, em relação à revisão
da Lei da Anistia. Ele afirma que mais importante do que punir os
torturadores do passado é promover uma aproximação das Forças Armadas
com a sociedade. “A cultura da tortura ainda está embutida, é preciso
inibir isso.” O jornalista Fernando Gabeira, preso e exilado por
participar do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, também
é contrário a revisões. “Punir gente com 80 anos pode dar a eles uma
aura de vítima, que eles não precisam ter.” Ainda na militância da
esquerda, Cid Benjamin e Milton Temer afirmam que o texto da lei ainda
dá margens para dúvidas, quando o assunto é a anistia a torturadores.
Fotos: Leo Martins/Agência O Globo; Roberto Castro/Agência Istoé
Comentários