Diretor de jornal é intimado por desaparecimento de trabalhadores na ditadura

 ArquivoO diretor do jornal La Nueva Provincia foi intimado pelo desaparecimento de dois trabalhadores que trabalharam no jornal durante a ditadura argentina. 

Adriana Meyer

Buenos Aires - O capítulo sobre civis processados por crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura está prestes a ter um momento mais do que problemático. O diretor do jornal La Nueva Provincia, da cidade argentina de Bahía Blanca, Vicente Massot, foi intimado a prestar depoimento nesta segunda-feira (18) como responsável pelo desaparecimento de dois trabalhadores gráficos desse periódico. Essa decisão é consequência de uma decisão da Câmara Federal bahiense emitida em novembro, em sintonia com a acusação feita pela promotoria ao considerar que o homem forte da imprensa naquele local integrou uma “associação ilícita, com o objetivo criminoso de eliminar um grupo nacional”, em conjunto com as Forças Armadas.

Massot, que chegou a ser vice-ministro da Defesa do governo de Carlos Menem, foi intimado pelo juiz federal interino de Bahía Blanca, Alvaro Sebastián Coleffi, e poderia ficar preso porque “todas as condições processuais estão dadas para que o juiz assim ordene, se o considerar pertinente”, segundo afirmou o site da Procuradoria.

Massot é acusado de ter feito parte dessa associação ilícita, para a qual teria contribuído atuando “de acordo com as normativas e diretivas militares e em cumprimento delas”. Nesse contexto, o empresário foi acusado como coautor do homicídio dos trabalhadores gráficos Enrique Heirich e Miguel Angel Loyola, “instigando-o, determinando-o, prestando contribuições indispensáveis para sua concretização material e encobrindo seus autores imediatos”. Ele também é acusado de ter realizado “contribuições essenciais”, que “consistiram no ocultamento deliberado da verdade” nos sequestros, torturas e homicídios de 35 pessoas.

A Câmara Federal bahiense havia ordenado em 14 de novembro que o juiz Coleffi convocasse audiência para que Massot pudesse tomar conhecimento das graves acusações que pesam contra ele: de fazer parte do aparato de inteligência militar que assolou a Bahía Blanca durante a ditadura, e de sua suposta responsabilidade no desaparecimento de trabalhadores gráficos do jornal. O tribunal de alçada havia indicado ao juiz de primeira instância que não há nada que o impeça, “se considerar necessário interrogar o acusado, que o faça em forma de interrogatório”.

Nesse caso, os promotores José Nebbia e Miguel Palazzani haviam pedido seu depoimento a partir de provas sobre a cumplicidade de Massot no sequestro e homicídio dos dois trabalhadores do La Nueva Provincia. Eles também querem investigar a fundo sobre o verdadeiro papel que o jornal desempenhou quando publicava notícias sobre os assassinatos de militantes – disfarçados de “enfrentamentos com a subversão” –, e fotografias de soldados e militares feridos.

Os promotores também queriam interrogar o ex-secretário de redação, Mario Gabrielli, mas ele faleceu em julho. Nebbia e Palazzani sustentaram que “o jornal, a rádio (LU2) e o canal (9) de TV, que compõem o grupo midiático junto com as Forças Armadas, fizeram parte da associação ilícita desempenhando papeis prefixados por regulamentações e planos militares, desde a interminável série de editoriais, publicações de notícias falsas, propaganda negativa, manipulação midiática e todas as ações psicológicas possíveis postas a serviço do extermínio”.

Tudo começou quando o tribunal que condenou o primeiro grupo de repressores bahienses em 2012 ordenou, em sua sentença, que se investigasse qual foi o grau de participação do La Nueva Provincia no terrorismo de Estado. O general Acdel Vilas, segundo comandante do Corpo V, referiu-se ao jornal como um “valioso auxiliar da condução”, lembraram os juízes Jorge Ferro, Martín Bava e José Triputti. E observaram que a atuação de Massot “não estava dissociada de toda a ilegalidade que existia na época”.

O site fiscales.gob esclareceu que Massot não foi convocado para prestar depoimento, mas que foi convocada uma audiência nos termos do artigo 279 do Código de Processo Penal da Nação. O texto estipula que qualquer pessoa “contra quem tenha começado ou esteja para começar um processo poderá se apresentar diante do juiz competente a fim de depor”. O mesmo artigo prevê que a “apresentação espontânea não impedirá que seja ordenada a prisão, quando for correspondente”. 


Tradução: Daniella Cambaúva 

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