Encontro de posições anti-históricas com intenções eleitoreiras em 2014

 

 

As baterias contrárias ao governo Dilma são lançadas por uma aliança já muito repetida pela direita com uma esquerda radical absolutista

O governo se fortalecerá com a ampliação da rede de energia, com o criativo programa Mais Médicos e com Luz para Todos. As baterias contrárias são lançadas por uma aliança já muito repetida pela direita com uma esquerda radical absolutista. Da corporação médica à Rede de Marina (rede que se construiu em nome de uma candidatura eleitoreira), passando por sermões sem raízes no coração das gentes.

Voltemos um pouco atrás na história. Quando começou a industrialização na Inglaterra, as velhas corporações se insurgiram e queimaram máquinas e novos teares. Na própria URSS nascente, muitos operários, crendo que eram agora os donos das máquinas, as levaram para suas casas e foi necessária uma reação do governo. Há posições que, na verdade, são retrógradas, isto é, caminham de costas para muitas pessoas concretas e para novos processos, tentando freá-los.

Isso vai emergir agora, com força redobrada, num ano eleitoral.

Dilma se fortalece com o aumento da rede energética e com Luz para Todos, que beneficiam milhões de brasileiros de todo o país e com o criativo Programa Mais médicos; este último favorece populações carentes e isoladas. Isso é insuportável, da direita até os psois da vida. De Merval Pereira a seus informantes esquerdistas.

É curioso ouvir a Rede Globo anunciar atrasos nas hidrelétricas, que poderiam levar a apagões futuros, mas não podem deixar de dizer imediatamente que isso se deve, em boa parte, à lerdeza de licenciamentos ambientais. Vemos grupos ecológicos e alguns religiosos, tudo fazendo para bloquear as construções. É claro que há que tomar precauções, o mais rápido possível, mas a partir de sugestões concretas que evitem danos às populações ribeirinhas, aos indígenas e ao próprio meio ambiente (às vezes tenho a impressão que muitos estão mais interessados nos peixes do que nas gentes).

O que se vê, entretanto, é uma posição absolutista irracional e atrasada, contra as hidrelétricas como tais. Para certos ecologistas radicais e setores religiosos com uma ética principista (não histórica, nem calcada em caridade personalizada), o que atrapalha são as pessoas concretas deste Brasil afora; eles se refugiam no sonho de um imaginário paraíso terrenal, com peixes e índios correndo livres num espaço rousseauniano que nunca existiu nem existirá. Por isso, repito, são posições anti-históricas.

Há uma fauna de intelectuais autoproclamados “orgânicos”, que fala em nome de suas convicções ideológicas aprioristas ou de uma ética com uma espiritualidade sem raízes numa misericórdia pessoal, sem conseguir ouvir o que teriam a dizer não só os consumidores de energia pelo país, mas as próprias populações ribeirinhas dos grands rios amazônicos, que se beneficiariam com emprego, energia e desenvolvimento local.

Há ONGS e pastorais que, enganosamente, pretendem falar em nome das populações concretas, substituindo-se a elas (já vimos na história esse “substutivismo” que denunciaram Rosa de Luxemburgo e o jovem Trotski, em falsas vanguardas, escudadas em teorias leninistas ou em preceitos cristãos mal assimilados). Quero insistir, há que denunciar o atraso de um certo ecologismo - com discursos pregando revoluções etéreas ou de um evangelismo desencarnado.

Francisco abraçou o imigrante malcheiroso em Lampedusa, beijou e acariciou as verrugas de Vinicio, enquanto seguem as pregações sobre o pobre, categoria social, em lugares comuns e citações que vão esvaziando aos poucos a radicalidade da Teologia da Libertação, que conheci de dentro nos anos 70, onde se descobria um irmão “amarillo, rotoso  ... pero em su ojo habia Dios” (Gustavo Gutiérrez citando Arguedas). Puebla indicou rostos dos pobres. E os Severinos suarentos, chegando estonteados às grandes cidades, são chamados pelo nome por um pastor sem maior ou nenhuma preparação teológica. Quem é o samaritano?  Da mesma maneira, um raquítico PCB – sobrevive ainda! – segue lançando sem fim para os ares, manifestos desproporcionais, sobre levantar massas, outra categoria vazia.

A outra ponta é a campanha muito bem orquestrada e financiada, contra  Mais Médicos. Aí vale tudo, desde descolar uma médica cubana isolada, homiziada num gabinete da Câmara (agora já há outro médico vivendo as benesses nos Estados Unidos). Há dinheiro corporativo para cooptar voluntários. Isso não é novidade. E a Associação de Medicina quer trazê-los para um projeto seu, arremedo enganoso do projeto governamental. Não consigo entender como a classe médica, em geral, possa estar de acordo com esse corporativismo criminoso (talvez se deixe enganar por lideranças apoiadas por um Caiado, também médico, que abre “generoso” seu gabinete espaçoso, saído de velha clã exploradora nas terras de Goiás).

 Surpreendeu-me ouvir uma médica que eu julgava lúcida, encampar posições retrógradas corporativas. Onde estarão médicos com outras posições? Ou a maioria saiu com a cabeça lavada nas Escolas de Medicina, esquecendo o juramento de Hipócrates, o que seria trágico. Há muitíssimos lugares onde os médicos tradicionais nem têm aparecido e as populações festejam os que chegam pelo programa governamental. E surgem tristes e ridículos ciúmes.

O que quero indicar, é que há alianças espúrias, talvez nem sempre conscientes, mas enraizadas em preconceitos de um país classista, ainda com ressaibos escravagistas que, para amaciar sua consciência, se refugiam no mito do bom selvagem, ou de uma imaginária e romântica terra sem males. Os males concretos e escandalosos estão aqui e agora, nas populações pobres e lascadas, sem saúde, nem eletricidade e com tantas outras carências sofridas.

A defesa, por exemplo, dos indígenas, se faz muitas vezes à margem das necessidades dos pobres colonos. E o ódio aos novos médicos que vão chegando, toca em profundas fibras elitistas, de quem se julga dono exclusivo do conhecimento médico ou guardião de regras de hierarquias com marcas sexistas (em geral médicos homens, enfermeiras mulheres, vejam o gênero embutido).

É preciso denunciar com força um programa de oposição que se vai constituindo.

Ainda bem que até agora não decolou, e por isso tem de juntar esforços: Aécio mais o cacique pernambucano, acolitado por uma Marina engasgada com uns milhões de votos que se vão evaporando.

(*) Luiz Alberto Gómez de Souza, sociólogo e cristão rebelde.
 

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