Marina e as baixarias de campanha
Enviado por Miguel do Rosário
A pré-candidata a vice-presidente Marina Silva assina um artigo hoje, na Folha, intitulado “Campanha de limpeza”. Não é um informe comercial sobre o novo sabão Omo, mas não fica longe disso. O discurso “programático” e “sonhático” agora dá lugar a uma utopia “higienática”, onde os debates políticos acontecerão num clima de total serenidade, como aristocratas inglesas a discutir o preço de Oxford, tomando chá, numa tarde fria de Londres.
Pena que Marina, no afã de condenar a baixaria, acaba ela mesma protagonizando uma outra, ao insistir na criminalização das redes sociais, tratadas por ela como “guerrilha virtual que cria territórios inóspitos na internet”.
É como se Marina voltasse aos anos de chumbo e reclamasse, para deleite das madames de Higienópolis, dos garotos subversivos que estão tornando irrespirável a vida política no país.
Ah, claro. Marina lembra das “multidões” que “foram às ruas no ano passado”, dizendo “claramente: essa política não me representa”.
Como é que é?
O papel aceita tudo. As “multidões” disseram muita coisa. Mas se houve uma coisa que as multidões NÃO disseram foi pedir por “limpeza” no debate político. Ao contrário, as pessoas nas ruas nunca xingaram tanto. Nunca quebraram tanto. Assembléias foram invadidas por jovens rebeldes que defecaram nas mesas, tiraram as roupas, picharam as paredes. Políticos, jornalistas e autoridades foram xingados e agredidos.
A multidão não foi à rua vender sabão Omo, Marina. Nem se portou com a educação que você agora, arrogantemente, exige às redes sociais.
A “guerrilha virtual” é o mal menor na política brasileira. E sobre a “guerra virtual” dos grandes meios, Marina não fala nada? Ela quer amordaçar as redes e deixar livre apenas a grande mídia, onde ela tem espaço garantido?
Marina está incomodada com as redes sociais porque ali ela não consegue manter incólume a sua pose esfíngica de evangélica-ecológica, política anti-política, partidária antipartido. Na internet a gente não engole bem essa história de progressista que não acredita em Darwin.
A maior baixaria política de 2013 foi cometida por um dirigente da Rede, companheiro de Marina Silva, que participou da reunião mais importante da legenda nos últimos meses, quando se decidiu pela fusão com o PSB de Eduardo Campos.
Falo de Pedro Piccolo Contesini, que confessou ter “pressionado” uma barra de ferro contra a estrutura do Itamaraty, em Brasília, num dos grandes dias das “jornadas de junho”.
Estranha liberdade essa que defendemos no Brasil. Um partido publica um texto onde se chama um proto-adversário de “tolo” e o mundo desaba: é baixaria!
Enquanto isso, arrebentar a fachada artística do Itamaraty com uma barra de ferro, aí temos uma violência popular “legítima”… A mesma turma que adorou ver o Brasil pegando fogo, que chancelou o quebra-quebra, agora vem posar de paladinos do bom comportamento na internet. Violência, para eles, tem de ser à vera.
O Globo faz charges diárias contra um homem doente e condenado, José Genoíno; Marina Silva não considera isso “baixaria”. Baixaria, para ela, faz o zé-joão de Campina Grande que, comentando num blog X, diz que “Marina é uma traíra”.
Por mim, acho ingênua ou hipócrita essa campanha contra a baixaria, geralmente puxada pelos que mais se prestam a fazê-la.
O perigo nas eleições de 2014 não está em baixarias das redes sociais, que existem desde os primórdios da internet e que, ao contrário do que Marina Silva diz, sempre foi protagonizada contra a esquerda, contra Lula e contra Dilma.
O perigo está em baixarias na grande mídia, em conluio com setores corruptos ou cooptados do Ministério Público, para produzir factóides às vésperas de eleição, com objetivo de manipular resultados. Não há compromisso com a verdade ou com a justiça. Basta produzir um factóide político.
A Ação Penal 470 foi o maior balão de ensaio de golpe já feito num país democrático nos últimos anos. Se é possível condenar um monte de gente por um crime político sobre o qual não se tem absolutamente nenhuma prova, então se pode fazer tudo quando se tem o controle ou hegemonia sobre judiciário e ministério público.
Na minha opinião, o discurso de Marina se inscreve na já longa lista de discursos que criminalizam a política. Debate político nas redes sociais, militância, tudo agora é “guerrilha”.
Entretanto, Marina vai mais longe:
Todos sabemos quem são os responsáveis por essa guerra. Eles estão na direção dos partidos mais poderosos, cujos militantes, geralmente remunerados, seguem sua pauta e comando no ataque aos alvos definidos. E chamam isso de tática e estratégia numa disputa supostamente ideológica entre esquerda e direita.
Todos sabemos? Que raio de código secreto é esse? Marina não disfarça: menciona “partidos poderosos” e seus “militantes, geralmente remunerados”. Ou seja, PT. Marina Silva insinua que os milhões de militantes petistas na internet são “remunerados”, provavelmente de maneira clandestina, e depois vem posar de paladina antibaixaria….
Ela faz a maior baixaria de todas, que é lançar uma suspeita genérica sobre um partido do qual ela nem diz o nome, sobre militantes em geral desse partido sem nome e vem falar em baixaria…
Marina Silva lança suspeitas sobre qualquer militante virtual da internet, a grande maioria formada por pessoas interessadas simplesmete em debater política, chamando-o de mercenários, e vem falar em baixaria…
O protesto de Marina nos lembra o batedor de carteira que grita “pega ladrão” e foge de fininho.
Cadê a crítica de Marina aos comentaristas do G1, esses sim, fascistas assumidos? Por que sua obsessão por “militantes” de partido político? Por que Marina não critica as baixarias dos blogs da Veja, dos quais ela mesmo já foi vítima tantas vezes? Por que ela foca apenas nos “militantes”?
Resposta: porque Marina aderiu à Casa Grande. Por isso ela se posiciona sempre do outro lado das trincheiras, ao lado dos banqueiros e suas mesas bem postas, servidas por empregados de uniforme. Lá, não há baixaria. Imagine um jantar na casa de Roberto Freire. Nada de baixarias, certo?
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