Editorial odioso e golpista do Wall Street Journal contra a Argentina

 Emir Sader

Quem ler a descrição que a jornalista do Wall Street Journal faz de Buenos Aires, terá a nítida impressão de que ela fala da Buenos Aires da crise de 2001-2002.

por Emir Sader em 15/01/2014

Quem lesse a descrição que a jornalista do Wall Street Journal faz de Buenos Aires, teria a nítida impressão de que ela fala da Buenos Aires da crise de 2001/2002: “Uma sensação de premonição se abatia sobre a cidade. A economia estagnada, a inflação em alta, o capital saindo do país e os portenhos de todos os âmbitos preparados para uma tormenta e resignados às penúrias que chegariam a essa cidade portenha”.

E continua a sensível jornalista norteamericana: “A infraestrutura da cidade também parecia abatida. Os amplos bulevares e grandiosos edifícios do século XIX estão cansados e enferrujados e as ruas cheiram mal. Os grafitis (enardecidos) e os cartazes despedaçados desfiguram as paredes, o que intensifica uma sensação generalizada de decadência sem lei.”

Até que chega o diagnostico dessa dramática situação: “Destruir a riqueza de uma nação leva um tempo longo, mas (e aí vem a surpresa) uma década de kirchnerismo, de governos encabeçados por Nestor Kirchner e por sua atual viúva, Cristina Fernandez de Kirchner, parece estar conseguindo isso.”

Aí vem a confusão. A descrição alarmante da situação de Buenos Aires não se refere às calamidades que o país viveu quando implodiu o modelo – cantado em prosa e verso pelo FMI e pelo próprio Wall Street Journal – neoliberal na versão menemista da paridade da moeda argentina com o dólar. Quando a expropriação massiva de grande parte da população argentina pelo  fim da paridade levou o país ao pior retrocesso da sua história – comparável, por Eric Hobsbawn, ao que viveu a Rússia com o fim da URSS – se podia viver imagens inimagináveis até ali.

Somado aos níveis mais altos de desemprego que a Argentina teve – país que viveu o pleno emprego em períodos anteriores -, o empobrecimento de amplos setores das classes médias e a disseminação da população de rua, Buenos Aires viveu os piores momentos da sua história. Algo incomparavelmente pior do que a jornalista do Wall Street Journal descreve.

Foi a partir dessa crise, do maior retrocesso que a economia argentina tinha vivido, que Nestor Kirchner primeiro, Cristina em seguida, puderam recuperar economicamente o país, para níveis altos de expansão econômica, apesar da pesada herança de desindustrialização, de privatização de empresas públicas – a começar pela YPF, que tinha propiciado a autossuficiência em recursos energéticos para o país -, a miséria, a exclusão social.

Foram dez anos de recuperação sistemática da economia, com níveis de crescimento altos, redução drástica do desemprego, que permitiram que os Kirchner ganhassem três eleições seguidas. No entanto, a jornalista fala de “destruição da riqueza de uma nação pelos Kirchner”. Certamente ela não conhece a herança recebida dos governos Menem e de la Rua, que dilapidaram a economia do país. Certamente ela não passou por Buenos Aires povoada pelos cartoneiros, gente inclusive de classe média, que vinha à capital para recolher tudo o que pudesse revender, reciclar, usar, populações no abandono quando implodiu a suicida política da paridade, tanto elogiada pelo Wall Street Journal.

No final do artigo a jornalista prognostica uma “explosão social”, fato que efetivamente aconteceu no final dos governos Menem e de la Rua. Tivesse ela reescrito seu artigo para aquele momento, até mesmo nisso ela teria acertado.

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