A lógica estúpida dos guarda-livros

Autor: Fernando Brito
antolhos
Outro dia, conversando com um amigo sobre os horizontes e perspectivas de nossas elites dirigentes, falávamos sobre a fugacidade da ideia de desenvolvimento que o império absolutista das finanças trouxe, em substituição à ideia de riqueza que dominou os tempos em que a indústria era o metro com que se avaliava o crescimento econômico.
O horizonte empresarial era, então, virtualmente infinito e a duração do ser humano que possuía, dirigia ou pertencia a estas organizações era, virtualmente, a da própria vida.

O famoso “relógio de ouro” da aposentadoria dos seus dirigentes e funcionários mais bem situados simbolizou, muitas vezes, esta ideia.
De alguma forma, isso também ocorria nos governos nacionais.
Seu lugar na história era definido pelas obras “perenes”  - perene, de fato, nada é – que deixavam ao país.
Os governos que nos ficaram como referência, o de Getúlio e o de JK, ficaram porque a ideia de desenvolvimento nacional reificou-se em siderúrgicas, usinas, estradas, numa petroleira e, até, numa cidade.
De alguma forma – ou de todas as formas – isso criou uma referência visível, muito mais que ideológica ao progresso social que marcou estes períodos.
E isso também se expressou, na superestrutura, em camadas de intelectuais e artistas, vindo da classe média,  capaz de produzir a expressão – na literatura, na música, na arquitetura – uma visão de brasilidade que era capaz de servir como “cola” para a formação de uma identidade nacional.
A elite brasileira, cada vez mais achatada numa uniformidade gerencial que administra sem transformar, não consegue olhar o país senão como às folhas de um livro-caixa.
Todo o seu foco está nos indicadores fugazes da economia: os juros, os décimos ou centésimos das taxas de inflação, o “depois da vírgula” do mês que passou ou do mês que virá.
Sua visão temporal é tão longa que seus gabinetes dispensam janelas.
E sua expressão na política é semelhante: embora o varejo seja a massa formadora do bolo político, sempre, emergiram as figuras que, mais ou menos, catalizavam as reações coletivas, para o bem e para o mal.
E, sem eles, os movimentos da sociedade viram um espuma, vistosa mas que se esfuma como as quimeras de Ary Barroso.
O debate nacional está interditado.
Só se pode trava-lo com uma visão de desenvolvimento e desenvolvimento com redução do desequilíbrio social.
Se adotarmos, para o Estado brasileiro, a lógica emburrecida dos guarda-livros sem horizonte, continuaremos sem oferecer referências futuras ao povo brasileiro. Ficarão para guiá-los apenas as do presente, e o presente de um barco pode oscilar, se ele tiver direção à proa.
Este é o desafio que 2014 nos reserva.
Escolher se vamos nos habilitar pela lógica dos balancetes ou se temos um destino que, embora sempre mais à frente – como é próprio da história social – nos anima a caminhar.
Para que a inclusão de nosso povo neste país não seja um “rolezinho” apenas.

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