Um retrato de Marina
Só ela, segundo as pesquisas, levaria Dilma ao segundo turno
A ex-senadora transpôs as barreiras sociais. Caiu, porém, nas velhas armadilhas
por Mauricio Dias — publicado 07/12/2013
Marina silva, ex-senadora (PT) e candidata (PV) à Presidência da República em 2010, obteve votação surpreendente e retumbante. Projetou-se com mais de 19 milhões de votos, expressando 19,33% do total de válidos no primeiro turno.
Foi uma vitória quase individual. Ela obteve apoio financeiro, mas não fez concessões às alianças partidárias. No segundo turno, manteve o individualismo. Adotou a solução “nem, nem”: nem Dilma, nem Serra. Voltou à cena, posteriormente, com a proposta de fundar um partido dela, o Rede Sustentabilidade. Perdeu, porém, o prazo de registro na Justiça Eleitoral e a chance de disputar a eleição em 2014 cavalgando um puro-sangue. Sem a contaminação dos partidos apelidados por ela de “tradicionais”.
Após isso, tomou outra decisão solitária. Deixou o PV e filiou-se ao PSB, partido tradicionalíssimo, presidido pelo governador Eduardo Campos (PE), político também tradicional.
Contradição? Marina foi, por cinco anos, ministra do Meio Ambiente do governo Lula. Não chutou o balde quando surgiu a história do “mensalão”. Saiu do cargo e do PT por outras razões. Ela continua em cena. A mais recente pesquisa Datafolha indica: se a eleição fosse hoje, só a presença de Marina Silva abriria possibilidade de haver segundo turno. Vale entender Marina com um olho na origem social dela. A ex-senadora encarna o papel de vencedora. Veio do fundo da sociedade. Na infância e na juventude, viveu em palafitas. Saltou as difíceis barreiras sociais. Caiu, porém, na velha armadilha.
O emergente, sem noção do mundo em que vive, no qual a ascensão de alguns sugere falsamente a ascensão de todos, olha o espelho e se vê com orgulho. Não raramente, porém, apedreja a mão que ajuda, como diz em verso célebre Augusto dos Anjos. Na história da valente Marina Silva alguns episódios refletem isso.
Em 1992, foi diagnosticada como portadora de mercúrio no sangue, doença rara que a levaria à morte. Esse diagnóstico só foi dado a partir da perícia médica de David Capistrano Filho, que sugeriu exames na raiz do cabelo de Marina. Ela morava em Rio Branco (AC) e era deputada estadual do PT. Não podia, portanto, ser tratada na rede pública de Santos (SP), então governada por Telma de Souza.
Capistrano era o secretário municipal de Saúde. Veio deste a ordem para o tratamento dela. Apoiou-se no que acreditava, como disse, e botou “a legalidade burguesa na lata do lixo”. Capistrano morreu em 2000, sem ouvir o obrigado de Marina.
Em 1994, foi eleita senadora. Em 1995, já empossada, solicitou aos petistas José Genoino e José Dirceu interferência junto a Antonio Carlos Magalhães, presidente do Senado. Buscava autorização para a Casa custear o tratamento dela nos EUA. Os dois foram a ACM e, imediatamente, ele pediu o parecer dos assessores. O parecer foi negativo. O Senado não poderia arcar com tratamento de doença existente antes da posse. No entanto, autorizou. Arcou com o risco de processo por improbidade administrativa. Ela se tratou no Massachusetts Hospital.
ACM, a exemplo de David Capistrano, morreu sem ouvir o obrigado de Marina.
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