EBC: uma greve histórica em defesa da comunicação pública

greve EBC

Tão importante quanto as conquistas do acordo firmado com a empresa foi o processo da greve e o reconhecimento do papel dos trabalhadores no fortalecimento do sistema público de comunicação

por Intervozes — publicado 26/11/2013 11:16, última modificação 26/11/2013 11:58
Por Jonas Valente*

Chegou ao fim, no último dia 22/11, a greve dos trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que durou 15 dias. A EBC foi criada a partir da Radiobrás e da TVE do Rio de Janeiro para ser a cabeça do sistema público de comunicação do país e congrega veículos importantes como a TV Brasil, a Agência Brasil, a TV NBR e diversas rádios, como as MEC AM e FM do Rio, a Nacional FM de Brasília e a Nacional da Amazônia.

O fortalecimento deste aparato, a valorização profissional e a garantia de condições de trabalho para realizar uma comunicação pública de qualidade foram os fatores que mobilizaram os mais de 700 empregados grevistas. Esse foi, antes de tudo, um movimento em defesa do projeto de oferta de informação e cultura voltadas aos interesses da população e à garantia de seus direitos.


A negociação começou no início de outubro. No dia 7 de novembro, os trabalhadores entraram em greve. A direção da empresa conseguiu levar o caso para resolução no Tribunal Superior do Trabalho. Ele iria ser encaminhado para ser julgado pela corte (o chamado dissídio coletivo) se não houvesse resolução do impasse.

Ao final, os trabalhadores aceitaram fechar um acordo de dois anos com reajuste salarial de 0,5% acima da inflação no fim de 2013 e 0,75% em novembro de 2014. Desde 2010 a empresa não concedia ganho real no fechamento dos acordos coletivos. Além disso, os empregados receberão quatro talões extras do auxílio alimentação, cada um valor de R$ 832 (nos meses de dezembro e junho de cada ano).

Um dos pontos centrais para o fechamento do acordo foi a manutenção das cláusulas sociais do Acordo Coletivo vigente. É o caso da obrigação do preenchimento de um mínimo de cargos de chefia por pessoas do quadro, a correção de casos de acúmulo e desvio de função, a possibilidade dos empregados avaliarem os chefes e o abono de faltas em casos de cuidados domiciliares. No início da negociação, a direção da empresa tentou retirar 10 itens por determinação do Ministério do Planejamento.

Outro elemento importante, e que viabilizou a celebração do acordo, foi a garantia da compensação das horas não trabalhadas. Em audiência de conciliação realizada no Tribunal Superior do Trabalho, convocada pelo ministro Barros Levenhagen, a empresa recuou de proposta apresentada anteriormente e disse que cortaria o ponto dos grevistas. Mas depois voltou atrás e assegurou a compensação.

A construção do projeto

Tão importante quanto as conquistas do acordo foi o processo da greve em si. Os empregados da Empresa Brasil de Comunicação perceberam seu poder de mobilização e se reconheceram enquanto um corpo importante para a preservação estratégica e a longo prazo deste projeto de comunicação pública com autonomia em nosso país.

Os trabalhadores saem da greve para continuar a luta por valorização. Pela transformação da empresa em um espaço com remuneração adequada, mas que também assegure capacitação para que os veículos possam ser referência em qualidade e inovação. E que seja gerido de forma democrática, com participação dos empregados nas instâncias políticas, editoriais e de gestão. Um dos objetivos é chegar a situações como as encontradas no Banco do Brasil e na Petrobrás, onde a ocupação dos postos decisivos por pessoas da casa é prática comum. A revisão do Plano de Carreiras da empresa, já iniciada e com fim previsto para o primeiro semestre do ano que vem, será o próximo momento crucial desse debate.

Um documento com demandas para melhoria dos veículos também começou a ser elaborado durante a greve. Outro com sugestões para o jornalismo já foi apresentado ao Conselho Curador da empresa. Esses processos serão retomados. O objetivo é se fazer presente no debate sobre as estratégias da empresa e de seus veículos.

Com isso em foco, as cobranças do movimento tiveram e continuarão a ter como alvo também o governo federal. Pois deve partir dele a garantia de investimentos e estrutura para que a EBC e o sistema público possam ser fortalecidos. Isso passa pela ampliação do orçamento da empresa e pela liberação dos recursos da Contribuição para o Fomento à Radiodifusão Pública. E pela garantia de espaço para as emissoras públicas no sinal digital, ao contrário da perda de espaço anunciada com a destinação da faixa de 700 MHz para a banda larga móvel.

É esse compromisso que fez dessa greve algo que vai muito além de uma luta corporativa. Essa agenda, que combina demandas do dia a dia acerca da necessidade de valorização profissional com decisões estratégicas para o futuro do sistema público de comunicação no país, coloca os empregados da EBC como atores importantes na construção desse projeto. E, mais importante: atores com disposição para lutar.

* Jonas Valente é coordenador geral do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal e editor da TV Brasil.

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom


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