Atirador de Paris denunciava em cartas a "manipulação das massas pelos media"

Testes de ADN permitiram perceber que o detido quarta-feira é Abdelhakim Dekhar, e é a mesma pessoa que baleou um fotógrafo no jornal Libération
Imagem do suspeito divulgada pelas autoridades francesas AFP

Os testes de ADN feitos ao homem detido na quarta-feira em com “fortes semelhanças” ao atirador de Paris que feriu gravemente um fotógrafo do jornal LIbération confirmam que o suspeito é de facto o atirador e revelam a sua identidade: chama-se Abdelhakim Dekhar e já tinha sido condenado em 1998 por um caso que envolveu armas de fogo e em que lhe traçaram um perfil com tendência para a efabulação.
A polícia francesa encontrou agora cartas em que Abdelhakim Dekhar denunciava a "manipulação das massas pelos media" e falava num "complot fascista", diz a AFP. Evocava também as guerras na Líbia e na Síria, e a forma como são geridos os subúrbios franceses, diz o Le Monde. O suspeito será submetido a uma perícia psicológica, anunciou o Procurador de Paris, François Molins. Quando foi capturado, não estava em estado de ser interrogado - estava sob o efeito de uma forte dose de medicamentos

Na segunda-feira, Abdelhakim Dekhar feriu a tiro um fotógrafo doLibération, depois de entrar na sede do jornal e abriu fogo também contra o banco Societé Generale, no bairro administrativo de La Defénse, antes de obrigar um automobilista a transportá-lo para os Campos Elísios, onde terá apanhado o metro. As autoridades policiais conseguiram detê-lo na quarta-feira e após as provas periciais não só comprovaram que era o autor dos crimes, como que já tinha sido condenado em 1998 no âmbito de um outro processo onde foi considerado cúmplice, adianta o jornal francês Le Monde.
A confirmação da coincidência do ADN e da identidade de Dekhar foi avançada pelo Ministério Público já depois da meia-noite. As autoridades tinham detido o homem ao início da noite de quarta-feira num parque subterrâneo de Bois-Colombes, uns subúrbios da zona oeste da capital francesa, depois de a polícia ter divulgado imagens do suspeito e recebido informações de uma testemunha que alegadamente tinha dado guarida ao homem na sua casa e que o reconheceu.
Abdelhakim Dekhar, de homem de origem argelina de 48 anos (há fontes que falam em 52), cumpriu quatro anos de prisão na sequência do casoRey-Maupin, em que dois jovens anarquistas se envolveram num plano para roubar armas à polícia, em 1994, e acabaram envolvidos numa perseguição pelas ruas de Paris em que acabaram por matar cinco pessoas, entre as quais três agentes da polícia, explica o Le Monde. Audry Maupin, um estudante de filosofia de 23 anos à altura dos factos, morreu nos confrontos. Florence Rey, de 19 anos, uma rapariga de uma família de classe média, que tal como Maupin se tinha começado a viver num squatem Nanterre, nos arredores de Paris, foi presa. Ambos faziam parte de grupúsculos anti-extrema-direita e anti-racismo.
Os dois jovens queriam armas para fazer assaltos e foi assim que se ligaram a Dekhar, que frequentava então os mesmos meios. Ele forneceu-lhes armas e terá participado também no ataque em que Maupin e Rey tentaram apoderar-se de mais armas policiais - embora ele tenha negado conhecê-los. Dizia fazer parte das forças de segurança argelinas e que tinha sido encarregue de uma missão para se "infiltrar na extrema-esquerda parisiense, que tinha ligações com os islamistas argelinos".
A sua advogada em 1998, que diz nunca mais ter tido notícias dele, recorda-o com muitas interrogações: "Nunca soube bem quem ele era. Dizia que era agente dos serviços secretos franceses ou argelinos, era muito secreto, não se confiava", disse Emmanuelle Hauser-Phélizon ao Le Monde.
O ministro do Interior francês, Manuel Valls, citado pelo Le Monde, congratulou-se com a detenção e identificação do autor dos dois crimes, mas salientou que falta “conhecer todas as suas motivações”, esperando que o inquérito dê agora essas respostas. Escusou-se, porém, a adiantar se o caso poderá ter motivações políticas, dadas as relações passadas do detido com movimentos da extrema esquerda.
A procuradoria adiantou, sem revelar pormenores, que “de momento o detido não está em condições de ser ouvido e a leitura dos seus direitos foi adiada”. Segundo o Le Monde, no entanto, o suspeito não terá sido ouvido porque, no momento da detenção, estaria sob o efeito de uma forte dose de medicamentos, referindo-se uma possível tentativa de suicídio. Terá, por isso, sido levado para o hospital e não para uma cela.
O homem é também suspeito de, três dias antes, ter entrado na recepção da televisão BMF e, depois de tirar dois cartuchos da sua arma, deitando-os para o chão, ter ameaçado: “Para a próxima, não vou errar.” Sobre este caso ainda não há informações.

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