Quem são os ‘otaku’, a nova geração de japoneses que não gosta de sexo
Postado em 24 out 2013por : Diario do Centro do Mundo
Publicado originalmente na BBC Brasil.
A não ser que algo aconteça para melhorar o índice de natalidade do Japão, a sua população vai diminuir por um terço entre agora e 2060. Um motivo para a falta de bebês é o surgimento de uma nova “categoria” de homens japoneses – os otaku, que gostam mais de literatura manga, anime e computadores do que sexo no mundo real.
Tóquio é a maior metrópole do mundo, com 35 milhões de habitantes, e é difícil acreditar que natalidade seria um problema aqui.
Mas Akihabara, área da cidade com forte tradição de cultura manga e anime, oferece uma pista sobre um dos problemas do país. Akhibara é o paraíso dos otaku.
Trata-se de uma geração de nerds que cresceu durante os últimos 20 anos de estagnação econômica. Eles preferiram se desligar do resto do mundo e imergir em suas fantasias. Hoje adultos, eles seguem com esse comportamento.
Kunio Kitamara, da Associação Japonesa de Planejamento Familiar, descreve estes japoneses como “herbívoros” – passivos e sem desejo carnal.
Eles são muito diferentes dos ambiciosos “machos alfa” do pós-Guerra, que na consciência coletiva do Japão foram responsáveis por reerguer o país e transformá-lo em uma superpotência.
Já os otaku vivem uma vida mais sedentária e com pouca interação com o sexo oposto.
Uma pesquisa do ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar em 2010 afirma que 36% dos japoneses com idades entre 16 e 19 anos não têm interesse em sexo – o dobro do registrado no levantamento realizado dois anos antes.
Dois otakus – Nurikan e Yuge – conversaram com a BBC sobre suas namoradas virtuais. As “meninas” chamam-se Rinko e Ne-ne, e são partes do jogo de vídeogame Love Plus, da Nintendo.
“É o tipo de relacionamento que gostaríamos de ter tido quando estávamos no colégio”, diz Nurikan.
No jogo, ele tem 15 anos, apesar de na vida real estar com 38.
“Enquanto eu tiver tempo, vou continuar com esse relacionamento para sempre”, diz Yuge, de 39 anos.
“Como ela está no colégio, ela passa para me pegar pela manhã e vamos juntos para a escola. Depois da escola, nos encontramos nos portões e vamos para casa juntos. No jogo, eu tenho 17 anos de idade.”
Yuge diz que costuma colocar Ne-ne – ou pelo menos a capa do jogo do Nintendo – em sua bicicleta, e que tira fotos junto com o jogo em vários lugares.
Ele é solteiro e tem vontade de conhecer uma mulher de verdade. Já Nurikan é casado. Mas ambos dizem que é mais fácil ter uma namorada virtual do que uma real.
“Na escola, você pode ter relacionamentos sem pensar sobre casamento. Com namoradas de verdade você precisa sempre considerar se vai casar. Então eu penso duas vezes antes de namorar uma ‘mulher 3D’”, diz Yuge.
Nurikan diz que sua esposa real não sabe da existência de Rinko, e espera nunca ter que escolher entre uma das duas.
Pais
Especialistas não sabem dizer exatamente porque esse mundo de fantasia tem tanto apelo entre os otaku.
O sociólogo Roland Kelts, baseado em Tóquio, diz que muitos japoneses são pessimistas sobre seu futuro. Eles não acreditam que terão a possibilidade de igualar a renda de seus pais, e por isso não querem se comprometer com relacionamentos.
“Se você comparar com China e Vietnã, por exemplo…Ali, a maioria dos jovens vão de moto para boates e dançam bastante, talvez tendo relações sexuais, pois eles sabem que estão melhorando, que vão superar a renda dos seus pais. No Japão, ninguém se sente assim”, diz ele.
Muitas pesquisas mostram que mesmo quando estão em relacionamentos, japoneses e japonesas têm poucas relações sexuais. Um levantamento mostra que apenas 27% disseram fazer sexo todas as semanas.
O número de casamentos também desabou, assim como a quantidade de bebês nascidos fora do casamento.
Outro problema populacional no Japão é a falta de imigração. Na Grã-Bretanha, uma em cada oito pessoas nasceu no exterior, comparado com uma em 60 no Japão. As regras de imigração seguem muito rígidas no país.
O Japão mantém sua cultura singular no mundo globalizado, mas em alguns casos – como no dos otaku – isso pode ser até mesmo prejudicial para os problemas populacionais do país.
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