Por que é bom torcer para que a China ganhe o leilão de Libra
O campo de Libra
Postado em 19 out 2013por : Paulo Nogueira
Uma questão tem sido virtualmente ignorada — ou deliberadamente distorcida — no controvertido leilão do campo de libra: a presença da China.
É a chamada boa notícia.
Torcemos para que a China ganhe. É o melhor parceiro que se pode ter hoje. Em seu excelente livro “The Winner Take All”, que relata a corrida organizada e bem-sucedida chinesa em busca de recursos naturais que garantam seu futuro, a economista Dambisa Moyo mostra como a China rompeu o paradigma ocidental nessa área.
Tradicionalmente, o ocidente promoveu guerras para tomar posse de áreas ricas em recursos naturais. Por meio das bombas, estabeleceu relações que eram absurdamente desfavoráveis para os países plenos de recursos. Veja o que os Estados Unidos fazem há anos no Oriente Médio, por exemplo, para assegurar petróleo.
A China, por ter uma natureza diferente, foi por outro caminho, demonstra Dambisa. Busca recursos naturais tendo por base uma relação em que ambas as partes ganhem. (Na brilhante definição do intelectual britânico Bertrand Russell, feita há cerca de um século depois de uma temporada na China, é um ‘país artista’, não feito para guerras.)
O papel da China na África ilustra perfeitamente isso. Dambisa, economista de prestígio internacional, está familiarizada com o quadro: é natural da Zâmbia.
Em 2002, conta ela, a China deu 1,8 bilhão de dólares para países pobres africanos. O dinheiro foi empregado em coisas como o treinamento de 15 000 profissionais africanos, a construção de 30 hospitais e 100 escolas e o aumento de bolsas de estudo para estudantes. “Dois anos antes, a China perdoara dívidas de 1,2 bilhão de dólares de países africanos”, narra Dambisa. “Em 2003, perdoou mais 750 milhões de dólares.”
O comércio bilateral entre a China e a África subiu de 10 bilhões de dólares em 2000 para 90 bilhões em 2009.
“A China oferece uma alternativa à África ao assistencialismo”, disse Dambisa numa entrevista recente à revista Época. “Estimula o comércio e o empreendedorismo, e cria empregos nas regiões em que está presente. É uma troca ou simbiose. A China é muito melhor para a África do que os Estados Unidos ou a Europa.”
Dambisa
Não é à toa que os países africanos, como mostram pesquisas, prefiram amplamente as parcerias com a China, e não com os americanos ou as potências europeias.
No Brasil, como se vê no livro de Dambisa, a China já é também um parceiro fundamental. Nos seis primeiros meses de 2010, a China multiplicou por 10 seus investimentos no Brasil e os elevou para 20 bilhões de dólares. Com isso, os chineses se tornaram os principais investidores internacionais no Brasil, à frente dos Estados Unidos. A China é hoje, além disso, o principal parceiro comercial do Brasil.
Faltam ao Brasil recursos para explorar rapidamente o petróleo de Libra? Pena. Que se busquem parceiros, e entre estes não poderia haver ninguém melhor que os chineses.
É patética, obtusa e demagógica a reação de líderes como Serra. “Agora vamos ficar numa relação de uma quase colônia da China, um neocolonialismo do Brasil em relação aos chineses, o que me parece incrível”, disse Serra esta semana.
O que diria ele se a parceria estivesse prestes a ser travada com os americanos? Você pode imaginar. Incrível mesmo é alguém ainda dar ouvidos para o bestialógico neonacionalista de Serra.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.
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