Poder econômico investe no Congresso e pode encolher bancada de trabalhadores

Diap alerta sobre movimentação de empresários, ruralistas, evangélicos e celebridades para ocupar cadeiras no Parlamento; e para o risco de bancada dos trabalhadores encolher

por Hylda Cavalcanti publicado 05/10/2013 12:23

Arte Congresso

Brasília – Os próximos 12 meses são de observação e cautela por parte dos representantes dos trabalhadores no Legislativo. Será necessearia uma forte articulação entre partidos e entidades diversas (como os sindicatos), com apoios aos parlamentares que representam os trabalhadores, para que o tamanho dessa bancada não fique cada vez menor na Câmara dos Deputados e no Senado. As bancadas dos evangélicos e do empresariado se preparam para voltar renovadas e em número bem maior no pleito de 2014.


A partir de avaliações preliminares de um estudo que ainda está sendo elaborado, o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) estima que a Câmara nas próximas pode passara por uma renovação só vista anteriormente em 1990, da ordem de 61% dos seus componentes. No caso do Senado, a renovação também acontecerá, mas não de forma tão expressiva – uma vez que é levado em conta o mandato de oito anos dos senadores.

Esse percentual de mudança da Câmara na próxima legislatura seria decorrente de vários fatores. Um deles é o fato de costumar ser de, em média, três a quatro legislaturas o período de mandatos consecutivos dos parlamentares – e muitos já estão concluindo este período. Em segundo lugar, porque muitos dos deputados e senadores da atual legislatura que são mais empenhados em defender os trabalhadores foram justamente os que tiveram dificuldades de obter votos suficientes nas últimas eleições, ficando em suplências e assumindo suas vagas depois do afastamento de algum outro parlamentar.

Há, ainda, os deputados que tendem a realizar uma campanha difícil em 2014 e podem não mais voltar – uma vez que não obtiveram boa quantidade de votos nas últimas eleições.

Reforma política
Na avaliação do líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI), o diagnóstico do Diap “só realça o quanto é importante uma reforma política e eleitoral no país”. “Tivemos, nos últimos anos, uma tentativa de fazê-la, mas é difícil a população entender a diferença de uma reforma política, inclusive para que possam ser feitas as outras reformas. Temos um modelo que permite a compra de mandatos, especialmente para o legislativo”, critica o ex-governador do Piauí, com origem no movimento sindical bancário. “Por conta disso não se valorizam os programas de cada legenda. Esse modelo é autofágico, do ponto de vista dos partidos. Um candidato do mesmo partido cria uma disputa violenta com o seu correligionário e precisa enfrentar, ainda por cima, a distorção do financiamento de empresas que escolhem os parlamentares que vão ajudar a eleger.”

O senador considera que quanto maior o número de parlamentares que forem eleitos pela força do dinheiro, mais esse tipo de procedimento vai influenciar as legislaturas seguintes, caso nenhuma medida venha a ser adotada pelo próprio Legislativo nos próximos anos.

Insatisfação
“Os partidos, interessados nos recursos do fundo partidário e na ampliação da propaganda eleitoral gratuita, ambos calculados com base no desempenho para a Câmara, têm priorizado o recrutamento de quadros e lideranças com o objetivo de aumentar suas bancadas de deputados federais. Além disso, as manifestações de junho e julho de 2013 demonstraram a insatisfação com a atual representação política, cuja imagem está muito negativa”, afirmou o analista político Antonio Carlos Queiroz, do Diap.

Para Queiroz, essa imagem ruim se dá tanto por conta dos escândalos de corrupção, quanto pelo fraco desempenho parlamentar no atendimento da agenda de matérias legislativas a serem votadas. Além disso, é prática corrente dos principais meios de contribuir, com seu noticiário, para a formação de uma espécie de senso comum negativo sobre a política e os políticos.

Enquanto isso, representantes de grandes bancadas, apoiadas por setores econômicos fortes, como a dos evangélicos, do empresariado e dos ruralistas, preparam-se para voltar ampliadas na próxima legislatura.

Conforme a avaliação de Antonio Carlos Queiroz, se não houver uma grande articulação das entidades sindicais, a bancada que defende os trabalhadores no Legislativo correrá o risco de ficar pequena diante de deputados e senadores menos comprometidos com a questões trabalhistas e causas sociais. “Essa perspectiva é preocupante”, acentua Queiroz, que acredita que o que mais vai pesar neste cenário é o número de desistências, por parte dos atuais parlamentares, de tentar a recondução ao Congresso.

É que tem sido grande o número de deputados e senadores anunciando que não deverão se candidatar nas próximas eleições, em função do desgaste provocado pelo período de campanha, os altos custos e as incertezas sobre retorno ou não ao Legislativo. Fazem parte deste último item a líder do PCdoB na Câmara, Manuela d'Ávila (RS) e os deputados Tiririca (PR-SP) e Alexandre Cesar (PT-MT). Tiririca – cuja votação expressiva ajudou a encorpar o quociente eleitoral da coligação da qual o fazia parte também o PT – é lacônico ao dizer que não gostou do parlamento e precisa retomar sua carreira artística.

Já Manuela, almeja uma candidatura a deputada estadual. Oficialmente, ela explicou que sua intenção é devolver ao seu estado a experiência acumulada nos dois mandatos em Brasília, mas entre pessoas próximas, os comentários são de que a líder do PCdoB estaria cada vez mais decepcionada com o ritmo de trabalho do Congresso, que considera desgastante. “Está na hora de trabalhar mais no Rio Grande do Sul”, ressalta, quando perguntada sobre o assunto.

O deputado Alexandre Cesar (PT-MT), que assumiu numa vaga como suplente e desde janeiro passado – com a posse do deputado Nilson Santos (PMDB) como prefeito do município mato-grossense de Colíder – tornou-se efetivo no cargo, foi outro a anunciar que não quer mais disputar. “Pretendo investir na minha carreira acadêmica e no meu escritório de advocacia. Sou procurador de Estado e já tenho dois mandatos no Congresso. Para mim, está bom”, enfatizou.

“Acho que vem por aí, nas próximas eleições, muita celebridade e pessoas ligadas às igrejas, à área de segurança e a setores mais conservadores”, avalia o analista do Diap. Segundo Queiroz, o esforço de setores da indústria e do empresariado, bem como evangélicos e ruralistas no pleito de 2014 pode vir a ser pesado. “A cada legislatura esse pessoal vem com maior participação e se os trabalhadores não tiverem clareza disso desde logo, as bancadas sindicais vão sofrer um efeito oposto ao deles”, alerta.

A perspectiva já começa a preocupar os parlamentares dos mais diversos partidos. “A bancada dos trabalhadores já é muito pequena e se perdermos mais parlamentares na próxima legislatura será o caos. Os sindicatos do Brasil inteiro precisam se articular, as categorias precisam defender candidaturas de nomes importantes dentro do Congresso”, diz o deputado Paulinho (SP), da Força Sindical e criador do recém-fundado partido Solidariedade.

“O que estamos vendo é fruto de como o Brasil tem seguido nos últimos anos, já que o prestígio da política nesse país é cada vez mais desesperador”, ressaltou o senador Pedro Simon (PMDB-RS), cuja primeira legislatura na Casa começou em 1979. “Aqui temos corrupção no Judiciário, no Executivo, na iniciativa privada, sem falar entre os parlamentares. Não temos notícia de milionário que tenha ido até hoje para a cadeia no Brasil e políticos corruptos que foram condenados mais de 20 vezes, nunca receberam sentença definitiva. Essa situação traz um desencanto com a política para os jovens e para profissionais sérios e renomados que poderiam dar grande contribuição para a vida política brasileira, mas não querem se candidatar a nada”, diz Simon.

Renovações altas
Atualmente, a bancada de representantes dos trabalhadores é formada no Congresso por 91 parlamentares. Destes, 83 são deputados e oito, senadores. Nos últimos anos, a taxa de renovação de parlamentares oscilou entre 43,86% (em 2008) e 44,25% (em 2010), só ficando mais alta anteriormente, nas legislaturas de 1990 (quando a troca de deputados e senadores foi de 61,82%) e de 1994 (quando foi de 54,28%).

Considerada “peso pesado” neste processo, a bancada evangélica anunciou, por meio de seus deputados, que pretende duplicar o número de pastores nas candidaturas a uma vaga na Câmara e Senado. A perspectiva é do grupo é passar a contar com cerca de 140 parlamentares na próxima legislatura. Por conta dessa preocupação, os evangélicos têm discutido entre si, nas últimas semanas, formas de evitar que entrem no Congresso, como representantes destas igrejas, deputados e senadores com problemas na Justiça e com a Lei da Ficha Limpa.

O objetivo seria evitar desgastes perante a opinião pública, uma vez que hoje, dentre os 73 parlamentares evangélicos, 23 respondem a algum tipo de processo no Supremo Tribunal Federal (STF). Também teria pesado, perante a bancada, o fato de um dos seus integrantes ter sido o deputado Natan Donadon (sem partido – RO), que hoje cumpre pena no presido da Papuda (DF) depois de ter sido condenado pelo STF por formação de quadrilha e fraude em licitações no seu estado.

“Estes cuidados estão sendo tomados por eles nas próximas eleições de forma detalhada e imagino que o pessoal não estará para brincadeira em 2014”, avalia o analista legislativo e cientista político Arthur Fernandes. "Todos os partidos têm buscado, de uma maneira geral, ter evangélicos nos seus quadros, de olho no crescimento destas religiões e no público que despertam”, explica o cientista político Alexandre Ramalho.

De acordo com o senador Pedro Simon, as igrejas que arregimentam líderes para serem candidatos, com raras exceções, “são praticamente entidades comerciais, porque fazem campanha como se estivessem oferecendo um produto”.

Em relação à bancada empresarial, que em 2010 registrou bom crescimento dos seus representantes na Câmara dos Deputados, a perspectiva é de que o número venha a ser ampliado. A bancada formada pelos empresários reúne, na atual legislatura, 45% do total da Câmara e do Senado e foi aumentada, do período entre 2008-2010 – quando eram 219 seus integrantes – para 273 integrantes na legislatura que vai de 2011 até janeiro de 2015. Os deputados e senadores desse grupo são donos de grandes, médias ou pequenas empresas, acionistas ou quotistas de conglomerados econômicos, comerciantes. Com muita disposição e condições, portanto, de arcar com os custos de uma campanha.

Informações de diretórios partidários do PT, PSB e PDT dão conta de que a estimativa de custo que está sendo feita para uma campanha a deputado federal em 2014 é de, em média, R$ 5 milhões para cada deputado federal a ser eleito. “Está muito difícil montar a chapa para deputado federal hoje”, reclamou o deputado Mário Heringer (PDT-MG), presidente da legenda no seu estado.

Heringer se queixou, principalmente, das composições partidárias que podem vir a beneficiar ou atrapalhar a composição das chapas em cada eleição. “Os candidatos novatos olham para o tamanho da chapa, veem quem está lá dentro e quando percebem que tem deputados com muito voto preferem tentar a sorte em outro partido. Em geral, seguem para legendas pequenas”, explicou o deputado, ao acentuar que esse tipo de crítica é generalizada.

“A renovação é importante mas acho que se avançarem as representações corporativas e religiosas sobre o parlamento teremos um retrocesso. Se começarmos a corporativar a representação com ruralistas, médicos ou empresários, teremos uma situação complicada no Congresso”, considerou o líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque (RS).

O deputado federal e atual presidente do PPS, Roberto Freire (PE), por sua vez, considera normal a renovação, embora, a seu ver, possa resultar num período inicial de baixa eficiência no Legislativo.

“O Brasil tem sempre uma média alta de renovação, mesmo que esse percentual varie. Acho normal o processo, mas ruim para o Parlamento, porque com uma mudança grande no número de deputados e senadores, há perda, no primeiro ano de legislatura, de eficiência dos trabalhos. As pessoas que assumem uma vaga como deputados ou senadores pela primeira vez costumam não ser preparadas para a função, normalmente não conhecem o regimento das duas Casas e até que venham a adquirir esse tipo de experiência, precisam de um certo tempo. Já vivenciei essa situação várias vezes e sei que, infelizmente, o processo ocorre dessa forma”, colocou.

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