Metade dos casos de corrupção vem de campanhas eleitorais, diz diretor da PF



O diretor de Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal, Oslain Santana, terceiro na hierarquia da instituição e tradicionalmente avesso a declarações públicas, afirma que pelo menos metade dos casos de corrupção tem relação com financiamento de campanhas eleitorais. Ele coordenou todas as grandes operações de combate contra fraudes em licitações, superfaturamento de contratos e contratação de ONGs de fachada desde 2011.

Podemos falar sobre a relação entre corrupção e campanhas eleitorais?



Cinquenta por cento das operações da Polícia Federal contra corrupção têm como pano de fundo financiamento de campanha. Quando você investiga um caso de corrupção, desvio de dinheiro público, vai ver lá na frente que tinha um viés para financiar campanha política. Então, se resolvessem fazer uma reforma política, diminuiria muito o crime de corrupção. Isso é fato. Normalmente, numa investigação, é um prefeito desviando dinheiro, parte do dinheiro vai para seus interesses pessoais e parte do montante, para financiar a campanha. Essa é a realidade hoje. Um prefeito, um deputado, um governador e por aí vai. Não dá para precisar em números, mas é fato. É a sensação que temos nas várias investigações em que trabalhamos. E são todos os partidos. Não é privilégio desse ou daquele. Todos. As várias investigações da PF e do Ministério Público comprovam o que a gente está comentando agora.

O que é possível fazer para diminuir esse tipo de problema?

Isso é opinião pessoal nossa como técnico. Tem que ter uma reforma política. O modelo atual de financiamento de campanha, se você não mudar, vai acontecendo esse tipo de crime: vão continuar desviando dinheiro público para esse financiamento. Qual é o melhor modelo? Não sei. Financiamento totalmente público ou financiamento privado só de pessoa física, com determinado limite, e colocando limites de quanto cada candidato pode gastar? Se for se candidatar a presidente pode gastar x, se for a governador em estado com PIB x pode gastar y. Não sou filiado a partido político, não trabalho na Justiça Eleitoral, mas o sistema atual não está funcionando. Só incentiva mais a corrupção. Vamos continuar enxugando gelo. A polícia vai continuar investigando, o Ministério Público vai continuar denunciando, o Judiciário julgando e vai continuar o problema. Nós não aprendemos com a lição de 89, do governo do presidente Collor. Por que ele foi cassado? Sobra de campanha. Isso que levou ao impeachment há 20 anos. Outros casos se sucederam e não se mudou o sistema. Todos os anos, integrantes de vários partidos afirmam que tem que ser feita a reforma política. São mandados projetos para o Congresso Nacional e não passam. Esse sistema atual tem que mudar. Só o financiamento de pessoa jurídica, sem limite de gastos, não tem como fiscalizar isso. A Justiça Eleitoral não tem estrutura. A polícia não tem estrutura. Esse sistema que tem hoje é para facilitar o caixa dois de campanha.
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O GLOBO

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