A batalha nordestina
Entrada do pernambucano Eduardo Campos na corrida presidencial embaralha a disputa pelos votos da região e obriga a presidenta Dilma a lançar novas armas
Cláudio Dantas SequeiraPOPULAR
Dilma veste o gibão de couro, roupa típica do vaqueiro nordestino, em visita ao
Piauí: em alguns Estados da região, a presidenta tem 60% das intenções de voto
Debruçados sobre o mapa do Nordeste, com
seus nove Estados, 37 milhões de habitantes e 26% do total de eleitores
que irão às urnas em outubro de 2014, estrategistas de Dilma Rousseff e
Eduardo Campos preparam-se para uma batalha decisiva. Em sua primeira
disputa presidencial, Eduardo tem obrigação de exibir um bom desempenho
na região que é seu berço político. Para a reeleição de Dilma Rousseff, a
conservação do eleitorado do Nordeste, que favorece o PT desde a
vitória de Lula em 2002, é ainda mais essencial. O quadro agora é outro.
Em 2010, quando Dilma e Eduardo Campos subiram unidos no mesmo
palanque, o PT foi buscar votos em locais que devem se tornar de acesso
muito mais difícil quatro anos depois. Na última eleição presidencial, o
PSDB assistiu, impotente, à derrota de José Serra
em Minas Gerais, o
que permitiu a Dilma ganhar o pleito também na região Sudeste por uma
diferença de 1,6 milhão de votos. Em 2014, com o mineiro Aécio Neves
como candidato tucano, essa performance dificilmente se repetirá. Dilma
vai precisar, portanto, de cada um dos 18,4 milhões de votos que recebeu
na primeira vez na região – e conquistar outros mais. No confronto
entre os antigos aliados Dilma e Campos, pode-se prever uma batalha de
longos punhais.ISOLADO
Num movimento chamado de “traição cirúrgica”, o PT
afastou-se do grupo político do ex-presidente José Sarney
A presidenta tem trunfos indiscutíveis na
região. No Nordeste, o Índice de Desenvolvimento Humano avançou 41% em
dez anos, contra 19% no Sul-Sudeste. Em julho, quando os protestos
derrubaram a popularidade de Dilma em toda parte, a queda entre os
nordestinos foi a menor do País. De acordo com pesquisas recentes, Dilma
lidera as intenções de voto com mais de 40% da preferência do
eleitorado. Em alguns Estados do Nordeste, seus índices chegam a 60%. Ao
medir um hipotético segundo turno entre Dilma e Marina Silva, a mais
popular candidata da oposição até seu partido cair no TSE, o DataFolha
descobriu que a presidenta venceria, no Nordeste, por 51% a 37%. No
cenário atual, esses indicadores certamente valem muito. A dúvida é se
eles serão mantidos até o ano que vem.
Levado a um confronto que tentou evitar até
o último momento contra o pernambucano Eduardo Campos, o Planalto está
convencido de que deve realizar um combate preventivo contra a tentativa
do adversário de ganhar musculatura. Desde a semana passada, as visitas
ao Nordeste tornaram-se prioridade absoluta na agenda de viagens
presidenciais. Dilma foi a Vitória da Conquista, no interior da Bahia,
entregar 1.740 unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida. Depois,
desembarcou em Salvador para assinar uma ordem de serviço para o novo
trecho do metrô, ao lado do governador petista Jaques Wagner. Nas
próximas semanas, a presidenta vai inaugurar uma adutora em Afogados da
Ingazeira, no sertão de Pernambuco, e a quinta etapa do “Eixão das
Águas”, no Ceará.
RUPTURA
O governador do Ceará, Cid Gomes, rompeu com Eduardo
Campos no mesmo dia em que este se afastou de Dilma
O primeiro ataque direto do Planalto a
Eduardo Campos foi preparado no silêncio dos bastidores políticos.
Enquanto o candidato do PSB ensaiava passos para fora do governo, o
Planalto se movimentou para trazer, para dentro, o senador Armando
Monteiro (PTB), concorrente fortíssimo à sucessão de Eduardo Campos. Um
dos grandes empresários do Estado, antigo presidente da Confederação
Nacional da Indústria e criado numa família com ligações históricas com
Miguel Arraes (avô de Eduardo Campos), Monteiro chega com credenciais de
quem pode abrir caminho para sua própria candidatura estadual, enquanto
cria obstáculos para o PSB no plano federal. “Com esse adversário, o
Eduardo não poderá sair de casa, sob o risco de perder votos
domésticos,” calcula um interlocutor de Dilma Rousseff.
Com tantas nuances, a campanha presidencial será marcada por um xadrez político muito bem estudado. Um primeiro cuidado de Dilma consiste em evitar ataques diretos a Eduardo Campos. Convencido de que, se a eleição chegar a um segundo turno contra Aécio Neves, o candidato do PSB poderá ser levado a apoiar uma candidatura coerente com sua história política, o PT não pretende tomar qualquer atitude hostil em direção a Campos. Por recomendação expressa de Lula, o adversário não deve ser afrontado nem criticado. Os ataques ferozes ficarão para adversários do PT de longa data, como o senador Jarbas Vasconcelos, do PMDB, no cenário pernambucano, e Marina Silva, no plano federal. Aguarda-se, por parte de Campos, um comportamento também cauteloso. Ele deverá evitar ataques diretos a Dilma e a Lula, pois calcula o risco que isso representaria para sua popularidade. Sem negar a paternidade do imenso canteiro de obras erguido pelo governo federal em Pernambuco, Campos vai lembrar que fez sua parte. Dirá que sua gestão teve capacidade de criar condições para atrair a iniciativa privada e que soube aplicar bem os recursos vindos de Brasília.
Com tantas nuances, a campanha presidencial será marcada por um xadrez político muito bem estudado. Um primeiro cuidado de Dilma consiste em evitar ataques diretos a Eduardo Campos. Convencido de que, se a eleição chegar a um segundo turno contra Aécio Neves, o candidato do PSB poderá ser levado a apoiar uma candidatura coerente com sua história política, o PT não pretende tomar qualquer atitude hostil em direção a Campos. Por recomendação expressa de Lula, o adversário não deve ser afrontado nem criticado. Os ataques ferozes ficarão para adversários do PT de longa data, como o senador Jarbas Vasconcelos, do PMDB, no cenário pernambucano, e Marina Silva, no plano federal. Aguarda-se, por parte de Campos, um comportamento também cauteloso. Ele deverá evitar ataques diretos a Dilma e a Lula, pois calcula o risco que isso representaria para sua popularidade. Sem negar a paternidade do imenso canteiro de obras erguido pelo governo federal em Pernambuco, Campos vai lembrar que fez sua parte. Dirá que sua gestão teve capacidade de criar condições para atrair a iniciativa privada e que soube aplicar bem os recursos vindos de Brasília.
Quando se olha o mapa do Nordeste,
verifica-se que o PT conseguiu uma proeza importante, ao estabelecer
duas fortalezas nas áreas de fronteira com outras regiões. Na linha
divisória com o Sudeste, encontra-se a Bahia de Jaques Wagner,
governador do PT que ficará no controle da máquina estadual até o último
dia do mandato, convencido de que, numa reeleição de Dilma, terá uma
posição assegurada em Brasília a partir de 2015. Na fronteira com a
região Norte, fica o Ceará dos irmãos Cid e Ciro Gomes, que romperam com
Eduardo Campos no mesmo dia em que este se afastou do governo. A
questão, como sempre, é encontrar atores adequados para cumprir os
papéis necessários. A popularidade de Cid Gomes é imensa no Ceará. A de
Lula é maior. Conforme o Vox Populli, 68% dos eleitores cearenses
votariam no concorrente que o ex-presidente indicar.
RIVAL
Adversário do PT de longa data, o senador do PMDB
Jarbas Vasconcelos tentará tirar votos de Dilma em Pernambuco
Na vida real, no entanto, o nome mais
popular para disputar o governo cearense é outro aliado, o senador
Eunício Oliveira, ex-ministro, do PMDB de Michel Temer – e adversário
inconciliável dos Gomes. Na terça-feira da semana passada, em reunião
com o presidente do PT, Rui Falcão, Eunício lembrou que aliou-se ao
partido antes da chegada de Lula ao Planalto e que Dilma só teria a
ganhar com sua candidatura. Se ele vencer a eleição, explicou, o
Planalto não só terá um “governador aliado”, mas também o PT ganhará um
senador a mais, já que o suplente, Waldemir Catanho, é petista filiado.
São argumentos bem pensados, mas é difícil imaginar que possam ser
acolhidos pelo Planalto, que se sente no dever de apoiar os irmãos Gomes
em qualquer decisão depois que eles se afastaram de um Eduardo Campos
cada vez mais incômodo, sempre alerta para construir alianças com
personalidades desgarradas do palanque de Dilma.
Foi o risco de fornecer mais combustível para o PSB que levou o PT a rever uma das mais polêmicas alianças eleitorais de sua história recente. Num movimento já chamado de “traição cirúrgica,” o partido ensaiou uma ruptura no Maranhão, afastando-se do grupo político do ex-presidente José Sarney, para apoiar Flávio Dino, do PCdoB, na disputa pelo governo do Estado. Pré-candidato de Sarney, o atual secretário de infraestrutura, Luis Fernando Silva, ainda não decolou, enquanto Flávio Dino lidera as pesquisas com tanta folga que sua popularidade subiu até nos protestos de junho. Inconformado com o acordo, fechado em segredo, o veterano Sarney reagiu. Mobilizou seus aliados na cúpula do Senado, ameaçando bloquear toda iniciativa do governo na casa onde usufrui de um ambiente muito mais amistoso do que na Câmara. Ameaçando uma adesão a Eduardo Campos, Sarney ligou para o próprio Lula, que, diante do risco, pediu para Dilma recuar. Num esforço para manter um palanque no Estado, a presidenta ainda trabalhava, na semana passada, com a alternativa de apoiar a candidatura de Roseana Sarney para o Senado, sem abrir mão da aliança com Dino. O problema é que o candidato do PCdoB, que já é cortejado pelo PSB de Eduardo Campos, manda dizer que tem pressa. A batalha deve ganhar intensidade nas próximas semanas.
Foi o risco de fornecer mais combustível para o PSB que levou o PT a rever uma das mais polêmicas alianças eleitorais de sua história recente. Num movimento já chamado de “traição cirúrgica,” o partido ensaiou uma ruptura no Maranhão, afastando-se do grupo político do ex-presidente José Sarney, para apoiar Flávio Dino, do PCdoB, na disputa pelo governo do Estado. Pré-candidato de Sarney, o atual secretário de infraestrutura, Luis Fernando Silva, ainda não decolou, enquanto Flávio Dino lidera as pesquisas com tanta folga que sua popularidade subiu até nos protestos de junho. Inconformado com o acordo, fechado em segredo, o veterano Sarney reagiu. Mobilizou seus aliados na cúpula do Senado, ameaçando bloquear toda iniciativa do governo na casa onde usufrui de um ambiente muito mais amistoso do que na Câmara. Ameaçando uma adesão a Eduardo Campos, Sarney ligou para o próprio Lula, que, diante do risco, pediu para Dilma recuar. Num esforço para manter um palanque no Estado, a presidenta ainda trabalhava, na semana passada, com a alternativa de apoiar a candidatura de Roseana Sarney para o Senado, sem abrir mão da aliança com Dino. O problema é que o candidato do PCdoB, que já é cortejado pelo PSB de Eduardo Campos, manda dizer que tem pressa. A batalha deve ganhar intensidade nas próximas semanas.
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