Cartel dá R$ 307 milhões de prejuízo à CPTM; Alckmin faz vista grossa



O presidente CPTM, Mário Manuel  Bandeira, é pessoa de confiança do governador Geraldo Alckmin
por Conceição Lemes
Nesta quarta-feira 11, a convite de deputados do PT, o presidente da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira, depõe na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), sobre o pagamento de propinas e formação de cartel em licitações da empresa.
A reportagem refere-se a oito concorrências feitas CPTM, todas ganhas por empresas delatadas pela Siemens como integrantes do esquema de corrupção e cujos contratos foram assinados este ano.
Seis delas têm como objeto reforma/manutenção de trens em circulação. Valor dos contratos: R$ 900 milhões.
Os dois maiores, assinados quando as delações da Siemens já eram públicas, custarão aos cofres públicos R$ 1,8 bilhão.
Essa concorrência — diz respeito à compra de 65 novos trens — foi aberta em março de 2013 e dividida em dois lotes.

O consórcio Iesa-Hyundai Rotem ganhou o lote 1 da concorrência 808513201100, cujo objeto era a aquisição de 30 trensSeu contrato, assinado em 9 de agosto de 2013, foi publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo (DOESP), em 13 de agosto.
CAF faturou o lote 2. Concorrência: 808513201101 para fornecer 35 novos trens à CPTM. Foi assinado em 31 de julho de 2013 e publicado no  DOESP, de 2 de agosto de 2013.
O leitor Wagner, nos comentários,  nos alertou:
Na mosca. De fato, no primeiro lote, cada trem saiu por R$ 28,89 milhões. No segundo, por R$ 26,27 milhões.
Portanto, a CPTM pagará para cada trem do lote 2 – é igualzinho ao do lote 1! — R$ 2,62 milhões a mais.
Considerando que são 35 trens, o contrato custará mais R$ 92,70 milhões aos cofres públicos, embora os equipamentos sejam os mesmos.
Essa diferença já não seria um indício do modus operandi do cartel delatado pelo Siemens e que superfaturava os preços de concorrências feitas pela CPTM?
Mas há outro flagrante da provável manipulação de preços e fraude nas concorrências 808513201100 e 808513201101, que denunciamos. Atente ao julgamento delas publicado no DOESP, de 22 de junho de 2013.
Curiosamente, o consórcio Iesa-Hyundai Rotem ganhou o lote 1, a CAF ficou em segundo lugar. No lote 2, ocorreu o inverso. CAF ficou em primeiro lugar, a Iesa-Hyundai Rotem, em segundo.
Por isso insistimos: Por que preços diferentes se os trens (cada um com oito carros) são exatamente os mesmos?
A MISTERIOSA CONCORRÊNCIA INTERNACIONAL DE 2012 PARA OS MESMOS 65 TRENS DA CPTM
As estranhezas detectadas nas concorrências 808513201100 e 808513201101, de 2013, nos fizeram aprofundar ainda mais a busca no DOESP.
E, aí, nova surpresa. Em 2012, a CPTM realizou a concorrência internacional nº 8190122011 para comprar os mesmos 65 trens de 2013.
A licitação internacional nº 8190122011, lançada inicialmente em março de 2012, foi republicada em setembro de 2012.
Mas, afinal, quem ganhou essa concorrência?
Questionei a assessoria de imprensa da CPTM. Ela não respondeu. Reiteramos a solicitação nessa segunda-feira 9. Nada.
O DOESP de 28 de dezembro de 2012 traz o seu julgamento (imagem abaixo). O consórcio CPTM, integrado pelas empresas Alston e CAF, foi desclassificado provavelmente por apresentar valor acima do de referência. Ou seja, a licitação foi declarada deserta.
Mesmo assim a pergunta crucial permanece sem resposta: Quem ganhou essa licitação?
Para saber só há um caminho: algum deputado perguntar isso diretamente ao presidente da CPTM, Mário Manuel Bandeira, nesta quarta-feira, durante  audiência na Alesp.
De qualquer forma, a licitação nº 8190122011, além de ter sido declarada deserta, tem outro ponto nebuloso.
Na página 293 do seu edital (tem 307 págs), está o cronograma físico financeiro. Em setembro de 2012, o preço de referência (o máximo) para os dois lotes da concorrência nº 8190122011 era R$1,58 bilhão. O lote 1, R$ 732,7 milhões. E o lote 2, R$ 851 milhões.
 
Lembram-se de que, em março de 2013, a CPTM abriu concorrência nº 8085132011 para aquisição de 65 trens, divididos em dois lotes?
Pois bem, o preço de referência determinado pela CPTM para os dois lotes, que em setembro de 2012 era R$ 1,58 bilhão, passou para R$ 1,95 bilhão na licitação de março de 2013.
Ou seja, R$ 370 milhões – 23% — a mais na concorrência 808513201101 para os mesmos 65 trens.
Mas, se considerarmos que os contratos foram  fechados por R$ 1,8 bilhão, são R$ 215 milhões a mais em relação ao preço referencial de setembro de 2012.
Agora, se a esses R$ 215 milhões acrescermos os R$ 92,70 milhões que 35 trens custarão além, serão R$ 307,7 milhões a mais. Ou seja, R$ 307,7 milhões de prejuízos aos cofres públicos.
Por isso estas são outras perguntas ao presidente da CPTM  nesta quarta-feira na Alesp:
1) Por que a CPTM pagou mais R$ 307 milhões pelos mesmos 65 trens?
2) Considerando a licitação da qual a Alston fazia parte foi desclassificada, será que ela foi subcontratada pela vencedora CAF?
3) Por que a CPTM não suspendeu a assinatura dos contratos de compras dos 65 trens, já que os contratos deles foram assinados após as denúncias do cartel terem vindo a público?
4) Pela legislação atual, não pode haver duas licitações para o mesmo objeto, ou seja, para a compra dos mesmos 65 trens em 2012, depois em 2013. Qual o recurso que a CPTM se valeu para legitimar essa operação?
A propósito, na semana passada, em 4 de setembro, o presidente do Metrô do Metrô, Luiz Antonio Carvalho Pacheco, foi à Assembleia Legislativa de São Paulo,  para  falar sobre as licitações e contratos firmados pelo Metrô com a empresa Siemens, especialmente em relação às denúncias de cartel.
Durante a audiência, o deputado estadual Adriano Diogo (PT-SP) perguntou ao presidente do Metrô:
1) A concorrência para o monotrilho da linha 15 prata (antigo prolongamento da Linha 2-Verde, do Metrô) tinha como preço de referência  na concorrência internacional nº 41889213 o valor de R$ 2,1 bilhões. Essa licitação, porém, foi declarada deserta. Sete meses depois o Metrô lançou a concorrência internacional nº 41180213 com valor referência de R$ 2,37 bilhões.
Essa licitação foi ganha pelo Consórcio Expresso Monotrilho Leste, do qual fazem parte a Construtora Queiroz Galvão (líder), a Construtora OAS, a Bombardier Transit Corporation e Bombardier Transportation Brasil. Valor:  R$ 2,46 bilhões, ou seja, R$ 365 milhões maior que a o valor de referência da primeira licitação, que foi declarada deserta.
O senhor poderia explicar como se ganha licitação acima do preço de referência e por que o governo paulista não coibiu a ação do cartel da corrupção, anulando essa licitação?
2) O contrato para o monotrilho da linha 15 Prata do Metrô já teve  três aditamentos, que somam quase R$ 220 milhões. Ou seja, o seu preço já é R$ 584 milhões superior a primeira licitação, que foi declarada deserta.
Essa é uma prática comum do cartel da corrupção, tendo em vista que a Bombardier e a Serveng são citadas na denúncia da Siemens, para aumentar os preços das obras? Por que o governo paulista não coibiu estas praticas?
3) A justiça  constatou  superfaturamento de R$ 326 milhões na linha da obra da linha 5 do metrô e afastou o presidente do metrô Sérgio Avelleda. Até o momento já houve aditamento de R$ 170 milhões nesta linha e se prorrogou a sua entrega. O senhor não considera imoral aumentar o custo de uma obra já superfaturada?
O presidente do Metrô não respondeu nenhuma dessas perguntas. E a mídia lá presente, cobrindo a audiência, também se calou, não noticiou nada disso
Será que o presidente da CPTM também vai deixar responder perguntas semelhantes, já que o  modus operandi do cartel que fraudava licitações no Metrô é o mesmo existente na CPTM?
Mas duas coisas são certas: o cartel fraudador causou prejuízos de R$ 307,7 milhões aos cofres públicos do Estado de São Paulo e o  governo Alckmin que acabou  fazendo vista grossa a esse superfaturamento.
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