O estilo Dilma de escolher o novo ministério
22 de novembro de 2014 | 04:13 Autor: Miguel do Rosário
O ministério pode ser novo, mas o estilo do governo continua o mesmo.
Comunicação zero.
Os novos nomes estão sendo vazados para a mídia à seco, sem que o governo dê uma palavrinha sobre os planos subjacentes às respectivas pastas.
Fazenda?
Joaquim Levy. Ponto final.
Não aparece um porta-voz (até porque não existe), nem secretário de imprensa (que também não existe), para dizer aos brasileiros que, independente do nome, o ministro vai seguir as diretrizes A ou B.
Agricultura?
Katia Abreu. Ponto final.
A informação vem seca e dura para engolirmos, sem que o governo tenha gentileza de vir à público explicar que a sua política de apoio à agricultura familiar vai continuar firme, ou mesmo se expandir, e que há planos para aprofundar a reforma agrária.
O anúncio de Katia Abreu na Agricultura tinha de vir acompanhado do nome do ministro para o Desenvolvimento Agrário, que é a pasta ocupada pelo representante da agricultura familiar, dos sem terra, e, geralmente, o maior defensor da reforma agrária dentro do governo.
Com isso, as acusações (justas) de conservadorismo, exacerbadas quando se lembram as posições tolamente antibolivarianas de Katia Abreu, seriam compensadas com elogios à ousadia nas áreas mais fundamentais para a esquerda que pensa a agricultura: o meio ambiente, as condições dos trabalhadores rurais e a questão fundiária.
O blog Diario do Centro do Mundo republicou, há pouco, trechos de um artigo de Katia Abreu para a Folha, sobre o bolivarianismo.
É um amontoado de exageros, e busca fazer festinha com o eleitorado de direita.
Mais uma razão para o governo entrar em ação, com um porta-voz explicando que o pensamento de Katia Abreu não reflete o pensamento do governo. E externar, então, o que o governo pensa sobre o tema.
Transparência, transparência, transparência.
Somente a transparência nos salvará.
Até nos EUA, pátria do direitismo, os dois principais partidos adotam extrema cautela para não ferir as suscetibilidades do eleitorado de esquerda, que é muito grande na terra do tio Sam.
Na última edição da New Yorker, um articulista lista os possíveis pré-candidatos dos Democratas que podem fazer frente à Hillary Clinton, considerada centrista demais, nas eleições presidenciais de 2018.
Outros nomes democratas ensaiam discursos mais progressistas, para seduzir um eleitorado desencantado com Obama.
O próprio Obama, ao lançar a medida que ajudará 5 milhões de ilegais, acena para a esquerda e sua imensa base social, com a qual deverá contar para enfrentar um congresso agora dominado por republicanos conservadores.
Ao mesmo tempo, o governo brasileiro poderia fazer política, ou seja, explicar a seus correligionários que o agronegócio não pode ser demonizado, e que o governo precisa de um nome forte do PMDB para aumentar a influência sobre a escolha do novo presidente da Câmara, e aprovar reformas democráticas.
Nas entrelinhas, ficaria subentendido que o governo já começou a lutar para derrubar Eduardo Cunha de uma possível presidência da Câmara.
Enfim, política se faz com ideias, com persuasão, com informação, e, sobretudo, com comunicação direta e constante entre o representante e o público.
É disso que Fabiano Santos falava, em entrevista à TV Brasil, quando dizia que “política transforma”.
O governo precisa entender que a escolha de ministros transmite uma mensagem à sociedade, inclusive na maneira como a informação é vazada.
Por isso mesmo, o processo de escolha dos novos ministros, que inclui as inevitáveis fofocas, tinha de vir acompanhado de entrevistas, depoimentos e esclarecimentos constantes por parte do governo.
Custa tanto assim contratar gente da área de comunicação e política?
Com todo o respeito aos ascensoristas e garçons, o Planalto não poderia mandar embora alguns servidores e ampliar a sua área de comunicação e política?
Não se trata de algo exatamente para beneficiar o governo, mas um gesto de respeito para com a população.
Recebi, há pouco, um longo email do presidente dos EUA, Obama, explicando a sua nova medida em apoio aos imigrantes ilegais.
Comunicação direta entre o presidente da república e o povo.
Dilma não pode fazer o mesmo?
Não pode mandar um email para todos os brasileiros, que se cadastrarem em algum site, explicando porque escolheu este ou aquele ministro, debelando assim as inevitáveis crises que surgirão, vide que será impossível agradar a todos?
Seria “bolivarianismo”?
Será que passaremos mais quatro anos abominando a comunicação do governo, que não existe?
É claro que, sem fazer nada, relegada à inércia total, a comunicação governamental só tende a se deteriorar, porque só se aprende fazendo.
Fazendo, errando, fazendo, acertando.
Comunicação é uma necessidade para uma governo democrático, e trata-se, repito, de um gesto de respeito para com o povo brasileiro, que não merece ouvir falar do governo apenas através da nossa mídia, cujos defeitos conhecemos muito bem.
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