Há um novo Collor na praça

Autor: Fernando Brito
collor
Há  menos de um ano, Marina Silva não conseguia reunir meio milhão de assinaturas para formar sua Rede Sustentabilidade.
Hoje, diz o Datafolha, ela teria 100 vezes mais pessoas – 51 milhões de brasileiros – dispostos a entregar-lhe não o comando de um partido, mas o comando de suas vidas e seu destino.
Mesmo que a gente já saiba que pode haver aí alguma “bonificação” das pesquisas, é um fato concreto que ela é a candidata de uma parcela expressiva de brasileiros.

A ilusão de que não há um fato real  turbinado no irrealismo estatístico das pesquisas é um erro que só nos leva à confusão e à perda da capacidade de combate.
Os números podem ser irreais, o que importa? É apenas parte da máquina de propaganda que já se enfrentou e sabia-se que não seria diferente agora.
O projeto de Brasil justo e desenvolvido está, de fato, em perigo.
O que produziu isso?
A resposta é a mais simples possível, evidente a todos: a mídia.
Nada se parece mais com Marina Silva que a eleição de Fernando Collor de Mello.
É um factóide destinado a produzir um único efeito: derrotar Dilma e Lula, como Collor destinava-se apenas a derrotar Brizola e o próprio Lula em 1989.
Só que agora, para derrotar o projeto nacional-desenvolvimentista que ambos representam.
O que era Collor, senão um político local transformado pela mídia em “caçador de marajás”, tanto quanto a “nova política” diz ser a negação dos vícios da democracia brasileira, não importa que reproduzindo e empolgando tudo o que há de mais retrógrado neste país que, sem cerimônia, migra de Aécio Neves para ela?
É um cogumelo – que brotou mais rapidamente, é verdade, porque a mídia, na esteira de uma tragédia, a transformou, em 15 dias, em tudo o que ela não é – mas também algo sem densidade, sem projeto, sem nada que seja a sua imagem de  mulher autoritária, sempre capaz de projetar-se como não-política, embora o seja há 20 anos, e uma moralista.
Marina ainda pode ser evitada, mas não com uma campanha insossa e “propositiva”.
Marina não propõe coisa alguma senão o que já propunha Aécio Neves, sem o mínimo sucesso.
Seu trunfo é, alem da exposição nauseante na mídia, a despolitização do país.
Despolitização que boa parte do PT ajudou a se construir.
O Datafolha solidifica o que já está claro para todos.
Marina é a candidata da direita e a sua penetração na juventude e na classe média emergente é fruto de uma visão limitada de que o progresso social, sem polêmica, sem debate, é o bastante para fazer vitorioso um projeto político.
Só há um discurso correto para enfrentá-la: é dizer claramente ao povo brasileiro que ela é a negação deste progresso.
Que, por detrás de sua figura frágil, estão as forças que fizeram tudo o que este país procurou vencer nestes 12 anos.
Mas o PT e o Governo comportam-se de forma tímida e covarde diante disso.
Tornaram-se “pragmáticos” e não reagem com a coragem que a hora exige.
Parece que há um temor reverencial que, no máximo, permite-lhes dizer que é inexperiente.
Pode não ser experiente em administração, embora o mais correto seja dizer que nisso é desastrosa.
Mas Marina não é inexperiente, porque há uma década constrói um processo pessoal de poder, pulando de galho em galho e não hesitando em conspirar contra tudo que a tornou uma personagem conhecida.
É preciso dizer claramente ao povo brasileiro o que sua candidatura significa, ainda que isso possa não ser o mais “simpático” eleitoralmente.
Que ela é a candidata das elites que Aécio Neves não conseguiu ser e que suas poucas propostas em nada diferem das do tucanato em ocaso: liberdade total ao capital financeiro, destruição da “era Vargas” que Lula representou, ruína do projeto nacional.
O povo brasileiro não a identifica com isso, até porque ninguém o diz.
Porque a construção da Marina candidata é feita de vazio e não se derrota o vazio sem conteúdo.
Não é desaparecendo ou calando que vamos contribuir para que o povo brasileiro compreenda o que está em jogo.
Nem tratando Marina Silva como uma “pobre coitada” a quem faltaria capacidade.
Ela a tem, sobretudo a de se emprestar às piores causas sob o discurso da moralidade.
Quem não tiver coragem de enfrentar o que ela representa, não merece representar algo diferente.

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