O que as mulheres grevistas de 17 podem nos ensinar cem anos depois

Arquivo Edgar Leurenroth / Unicamp
Cerca de 400 trabalhadores da indústria têxtil, localizada no bairro da Mooca, iniciaram a greve que em poucas semanas se espalhou por todo o paísCerca de 400 trabalhadores da indústria têxtil, localizada no bairro da Mooca, iniciaram a greve que em poucas semanas se espalhou por todo o país

As mulheres – funcionárias da indústria têxtil - foram responsáveis pelo início da greve que em poucos dias tomou proporções gigantescas. Até hoje é considerada a maior greve do país, guardadas as proporções da população da época.

Sem leis trabalhistas, as operárias pediam, entre outras coisas, aumento de salários e redução das jornadas de trabalho, além de melhores condições de trabalho. Em poucas semanas, a greve se espalhou por diversos setores da economia, por todo o Estado de São Paulo e, em seguida, para o Rio de Janeiro e Porto Alegre. Era a primeira "greve geral" no país.



Esta carta, reproduzida no Vermelho na íntegra, mostra a consciência de classe daquelas trabalhadoras que passavam mais de 10, 12 horas por dia confinadas nas fábricas submetidas a trabalhos extenuantes. Elas destacam o fato de os soldados, apesar das fardas, serem também operários submetidos à ordem dos “grandes industriais que não têm pátria”.

Esclarecidas, aquelas trabalhadoras condenavam o capital estrangeiro que hoje, cem anos depois, age cada vez mais sem escrúpulos através das elites nacionais. “Não vos presteis, soldado, a servir de instrumento de opressão dos Matarazzo, Crespi, Gambu, Hoffmann, etc, os capitalistas que levam a fome ao lar dos pobres”.

Como em 1917, hoje a polícia brasileira usa força desmedida para repreender as manifestações cujo objetivo agora é barrar retrocessos. Há cem anos as mulheres já alertavam os soldados sobre a importância de respeitar a luta dos trabalhadores que dizia respeito, de certa forma, a eles também. “Soldados! Não deveis perseguir os nossos irmãos de miséria. Vós também sois da grande massa popular e, se hoje vestes a farda, voltareis a ser amanhã os camponeses que cultivam a terra ou os operários explorados das fábricas e oficinas”.

Leia a carta das mulheres grevistas aos soldados na íntegra: 
A carta das mulheres grevistas de 1917

Soldados! Não deveis perseguir os nossos irmãos de miséria. Vós também sois da grande massa popular e, se hoje vestes a farda, voltareis a ser amanhã os camponeses que cultivam a terra ou os operários explorados das fábricas e oficinas.

A fome reina nos nossos lares e os nossos filhos nos pedem pão. Os perniciosos patrões contam, para sufocar nossas reclamações, com as armas de vos armaram, oh soldados!

Essas armas eles vo-las deram para garantir seu direito de esfomear um povo.

Mas, soldados, não faças o jogo dos grandes industriais que não têm pátria.

Lembrai-vos que o soldado do Brasil sempre se opôs à tirania e ao assassinato das liberdades.

O soldado brasileiro recusou-se no Rio a atirar sobre o povo quando protestava contra o imposto do vintém e até o dia 13 de maio de 1888 recusou-se a ir contra os escravos que se rebelevam, fugindo ao cativeiro!

Que belo exemplo imitar!

Não vos presteis, soldado, à servir de instrumento de opressão dos Matarazzo, Crespi, Gambu, Hoffmann, etc, os capitalistas que levam a fome ao lar dos pobres e gastam milhões mal adquiridos e que esbanjam com as “cocottes”.

Soldados!

Cumpre o vosso dever de homens! Os grevistas são vossos irmãos na miséria e no sofrimento. Os grevistas morrem de fome ao passo que os patrões morrem de indigestão!

Soldados! Recusa-vos ao papel de carrascos!

São Paulo, junho de 1917.

Um grupo de mulheres grevistas



Do Portal Vermelho

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