Michel Temer e o Brasil a seguir: sonhos e pesadelos a repetir o passado

AO ABISMO
O presidente imagina estar voando rumo ao futuro, e está. Um futuro desprezível, é verdade. O melhor a que ele pode aspirar é ser considerado um pequeno – bem pequeno – Eurico Gaspar Dutra
por Flávio Aguiar publicado 14/10/2016 12:18, última modificação 14/10/2016 12:34
ARQUIVO EBC / PMDB
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Eurico Gaspar Dutra e Michel Temer: trajetórias tortuosas para chegar ao poder e legados pouco elogiosos para a história
Antes de ser presidente, Eurico Gaspar Dutra (1883-1974) foi homem de confiança de Getúlio Vargas. É verdade que, durante a 2ª Guerra Mundial, favorecia o Eixo, em detrimento dos Aliados, coisa que, hoje se sabe, jamais passou pela cabeça daquela esfinge chamada Vargas.

Finda a guerra, Dutra aderiu rápido ao rumo dos vencedores. Participou da conspiração – de direita – para derrubar Vargas, em 45. Derrubou. Surpreendentemente, Vargas apoiou-o para a Presidência, contra o brigadeiro Eduardo Gomes, da Aeronáutica. Dutra se elegeu, graças ao apoio do presidente a quem traiu.
E fez tudo ao contrário. Até hoje é conhecido como “o inimigo do salário mínimo”. Durante seu governo, de 1946 a 1950, o salário mínimo congelou, que é o que, mutatis mutandis, Temer quer fazer agora.
Sob a gestão Dutra, houve quebra-quebras pelo país inteiro, sobretudo por causa dos aumentos nos preços das passagens, o que penalizava os trabalhadores. Dutra reprimiu os sindicatos e a esquerda. Em seu governo - como querem fazer agora com o PT – cassou-se o registro do Partido Comunista (então chamado do Brasil, pró-soviético), e foram cassados os mandatos dos parlamentares comunistas, inclusive o do senador Luiz Carlos Prestes.
Atendendo aos reclamos da Guerra Fria, Dutra – antes simpático ao Eixo – alinhou a política externa brasileira à dos Estados Unidos. Mais ou menos como quer agora fazer o governo Temer, através da chancelaria de José Serra.
Dutra tentou iniciar um programa de atendimento à saúde, educação e outras funções sociais do Estado, sem resultado. Bom, pode ser que o governo Temer sequer isto tente.
Mas Dutra e seus ministros da Fazenda confiavam em que, finda a Segunda Guerra, os Estados Unidos voltariam seus olhos misericordiosos para o nosso país, um cancro de paz na turbulência hispano–americana que os cercava.
Vã ilusão.
Os Estados Unidos tinham outras prioridades: reerguer o Japão e a Europa.
O governo Dutra afundou, queimando as reservas líquidas que tinha em moedas conversíveis. Abriu o caminho para a volta de Vargas, a seu contragosto. A direita contou com o braço militar para se contrapor a Vargas e depois a Jango.
Agora Temer e os golpistas contam com setores do Judiciário para bloquear a possível volta de Lula. Pode ser que aconteça.
Mas o Brasil vai adernar, em direção ao retorno ao Mapa da Fome, à miséria crescente, à insignificância no cenário internacional.
Vai chegar lá? Pode ser. A direita brasileira conta com isto, com a redução à pobreza extrema de pelo menos 2 milhões, talvez mais, de famílias do país, para manter seu exército de serviçais sob a forma de empregadas domésticas, e outros subservientes nos moldes antigos, sem carteira assinada.
Mas pode também não ser.
É verdade que o cenário internacional não está para amadores como Serra, Jucá, Moro e outros, bons para manipular a atmosfera política interna, mas nulos em matéria de reconhecer o que vai pelo mundo.
Há dois cenários possíveis: os Estados Unidos se recuperam (improvável) e a Europa se recupera (também improvável). O que acontece? Os capitais financeiros acorrerão para estas áreas. O Brasil fica de fora, isolado de muitos dos seus vizinhos.
Outro: ninguém se recupera. Fica tudo como está, e o Brasil fica isolado, afundando com seus vizinhos.
Não vai adiantar o PSDB querer administrar a hecatombe pós-Temer.
Ou vicejará um Bolsonaro da vida, mesmo que mitigado, ou uma nova liderança de esquerda. Esperemos que triunfe a segunda opção.
Para a História, Temer já era.

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